sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

O dia em que a enteada de Gilmar salvou a vida de Genoíno

SEG, 15/09/2014 - 13:38 - ATUALIZADO EM 12/12/2014 - 10:42

Luis Nassif

Larissa Feitosa alertou o juiz da Vara de Execuções Penais, Ademar de Vasconcellos. Mas a VEP proibiu a remoção para o INCOR


Recebo telefonema de Guiomar Feitosa, esposa do Ministro Gilmar Mendes, do STF (Supremo Tribunal Federal) e mãe da terapeuta ocupacional Larissa Feitosa.

Anos atrás, Guiomar foi alvo de acusações de nepotismo. Solicitou espaço no Blog para se defender. As explicações, satisfatórias, foram integralmente respeitadas e acatadas pelo Blog.

Em vista desse histórico, Guiomar solicita justiça para sua filha.

Na semana passada, Larissa foi alvo de reportagem no Estadão Online, informando ter sido uma das 16 pessoas readmitidas no serviço público do Distrito Federal pelo recém-eleito governador José Roberto Arruda, depois do ato espetaculoso de demitir 14 mil funcionários. A reportagem relacionava o episódio com a defesa apaixonada de Arruda, feita por Gilmar junto ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

Em vez de informar sobre o currículo de Larissa, a assessoria de Gilmar enviou uma nota ao jornal esclarecendo que, na época da readmissão, Larissa ainda não era enteada de Gilmar. Por aqui, rebati mostrando que, naquele período, Guiomar e Gilmar se relacionavam e que a defesa recorria a uma mera formalidade como álibi.
O trabalho de Larissa

Guiomar não pretende defender a atividade do marido. Considera-o um juiz rigoroso no cumprimento da lei, que não se curva a nenhuma pressão e, com suas sentenças, contenta 50% das pessoas e desconta outros 50%. Ensaia uma defesa dos argumentos que utilizou em favor de Arruda, mas decide se concentrar na defesa da filha, falar da filha, de seu currículo e seu trabalho. E, da conversa - e de indicações de matérias na Internet - emerge um novo personagem, com vida própria e obra significativa.

Como Gerente de Saúde Prisional do Distrito Federal, Larissa conseguiu transformar o sistema prisional local em referência nacional, trabalhando justamente no presídio da Papuda - que recebeu os condenados pela AP 470.

Alguns prisioneiros da Papuda trabalham em regime semiaberto, diz Guiomar. De dia trabalham e voltam para a Papuda para dormir. A filha trabalha em regime semifechado. Passa o dia na Papuda e somente chega em casa para dormir quase sempre depois das 20 horas.

Algumas vezes, quando não conseguiu apoio para seu trabalho, Larissa pensou em desistir do emprego, mas sempre voltou atrás pela quase impossibilidade de encontrar alguém que se habilitasse àquele trabalho.

Guiomar lembra que se a filha estivesse atrás de cargos públicos, não seria no presídio da Papuda com seu trabalho insano.

Considera-se uma funcionária da saúde, sem ligações partidárias. Mas, para a mãe, admitiu: "Eu trabalho desde 2002 no DF, e Agnelo foi o único governador que efetivamente fez alguma coisa na área da saúde. Só que a saúde é tão caótica, que não aparece o trabalho feito".

No trabalho, Larissa conseguiu vários avanços civilizatórios.

Implementou mamografia para presidiárias, conseguiu a proibição para consultas médicas do presidiário no pátio - nas quais o prisioneiro tinha que se desnudar na frente de todos os colegas. Coordenou mutirões de vacina contra a gripe influenza em seis unidades prisionais.

Todo preso que entra no sistema prisional recebe uma palestra sobre saúde, sobre as doenças mais comuns. Há atualização no cartão de vacinas para adultos, que preenche um questionário informando se é dependente químico e as prioridades do que ele precisa - se médico, se serviço social.

As entradas no sistema prisional acontecem às terças e sextas-feiras, uma média de 90 a 150 prisioneiros recebidos por uma equipe de saúde para as consultas iniciais. Depois, recebem atendimento na Unidade de Saúde.

A visão de Larissa é que o prisioneiro não é apenas ele, mas eu entorno, sua mãe, esposa, filhos, que não podem ficar abandonados com sua prisão. Quando um abusador sexual é libertado, por exemplo, monta-se todo um atendimento fora para acompanhar pais que abusaram de filhas e que estão de volta ao seio da família.

"Eu sei a mudança que foi feita na saúde no Distrito Federal", conta Larissa. "O problema é que as pessoas não tem memória". Quando Agnelo assumiu, o Hospital de Ceilândia estava fechada. A saúde prisional tinha uma equipe apenas para 11 mil prisioneiros.

Seu trabalho foi elogiado pelo juiz da Vara de Execuções Penais do Distrito Federal (http://migre.me/lE5ip), que se considerava seu parceiro.

Coincidência ou não, um dos grandes trabalhos de Gilmar, à frente do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) foi um mutirão carcerário, destinado a libertar presos que já tinham cumprido sua pena.
O caso Genoíno

A maior prova do caráter de Larissa foi dada no episódio José Genoíno.
Quando Genoino entrou no presídio, o médico estava de férias. Na sexta-feira foi convocado um médico para os primeiros exames, que constatou que Genoíno estava bem. Na quarta-feira houve alteração no exame. Genoíno piorou sensivelmente e o médico recomendou que fosse encaminhado para o Incor.

Mesmo informado pelo médico de que Genoíno apresentava agravamento no quadro, e da confiança que dizia depositar em Larissa, o juiz da VEP, Ademar de Vasconcelos, apareceu na Papuda e proibiu a remoção.

No dia seguinte, Larissa sugeriu para o médico repetir o exame. A conclusão foi taxativa: tem que ser removido para o Incor, não tem escolha.

Larissa resolveu agir por conta própria. Ligou para o Secretário da Saúde, que entrou em contato com a direção do Incor. O Coordenador do Sistema Presidiário veio falar com ela. Sua posição não mudou: não se trata de opção, Genoíno vai para o Incor.

Decidiu não informar o juiz da decisão, para não colocar a vida de Genoíno em risco. Do lado de fora, a imprensa vigiava cada passo. Larissa foi na frente para preparar a entrada no Incor. E o Diretor do presídio e o médico seguiram com Genoíno em um carro descaracterizado, a salvo da imprensa. Pelos resultados dos exames, o Incor não descartou a possibilidade de infarto.

Do hospital, ligou para a mãe. "Mamãe, estou aqui com o Genoíno, tive que tirar porque senão ele poderia ter uma coisa dentro do presídio, e acho que o Joaquim (Barbosa) virá com tudo para cima de mim. Serei responsabilizada, mas não tinha alternativa".


Houve uma confusão na blogosfera, com os blogs informando de um laudo atestando a gravidade da doença de Genoíno, supostamente assinado por ela.

Larissa era Gerente de Saúde Prisional, terapeuta ocupacional, nunca se declarou médica nem assinou laudo algum. Mas sofreu uma forte investida da categoria dos médicos.

Jamais se manifestou publicamente, aguentando tudo calada.

Em casa, desabafava com a mãe, inclusive como testemunha dos abusos cometidos contra os prisioneiros da AP 470.

Quando as promotoras do Distrito Federal e o juiz da VEP falaram dos supostos privilégios concedidos a José Dirceu e a Delúbio ficou indignada. "Mamãe, isso é falso. Eles não têm privilégio algum".
As implicações do caso

O depoimento de Larissa levanta uma questão grave.
Há que se apurar as responsabilidades.

A do juiz Ademar Vasconcellos é evidente. Foi pessoalmente informado sobre a gravidade do quadro do Genoíno. E desconsiderou a informação e proibiu a remoção de Genoíno para o hospital.

Em relação às juntas médicas que atestavam a suposta boa saúde de Genoíno, se as condições do paciente estavam sujeitas a alterações – conforme atestado pelo laudo médico da Papuda – como pode um laudo médico basear-se exclusivamente em laudos obtidos em condições ideais de repouso, se o laudo serviria para mantê-lo justamente onde sua saúde piorava?

Não se sabe ainda até que ponto essas informações chegaram ou não a Joaquim Barbosa.

Mas não dá para varrer para baixo do tapete esses episódios. Houve uma ação deliberada que submeteu Genoíno a risco de morte e só não se consumou devido ação abnegada de funcionários públicos exemplares.

Esse trabalho macabro só foi interrompido quando o Ministério Público Federal entrou no caso e, através da Procuradora Geral em exercício, Ela Wiecko, colocou bom senso no episódio e interrompeu o massacre.

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