terça-feira, 28 de agosto de 2012

As lições não aprendidas do mensalão


Luis Nassif

Coluna Econômica
28.08.2012 11:18

Na sua coluna de ontem, no jornal O Valor, o respeitado Renato Janine Ribeiro publica carta enviada pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Nela, FHC questiona afirmação de Janine sobre a cooptação de votos para a aprovação da emenda da reeleição. “Esta existiu, diz, mas por parte de políticos locais”.

Apenas constata que fez o mesmo do mesmo. Apenas, de uma forma mais “profissional”.

É importante o seu depoimento. E lembro aos leitores que o eixo de meu artigo estava na tese de que as questões de corrupção, que pareciam tão claras quando o lado do bem se opunha à ditadura, se transformaram num cipoal desde que PT e PSDB se digladiam”, conclui Janine.

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Tanto no mensalão como na votação da emenda da reeleição, o objetivo era a cooptação de parlamentares. Apenas os métodos foram diferentes.

No período FHC, a cooptação se deu através das emendas parlamentares, prática inaugurada no seu governo.

Cada emenda envolve três tipos de interesse: do parlamentar que a propôs, da empresa que será beneficiada com ela e do governo federal, a quem cabe a sua liberação.

Havia, então, uma triangulação.
Os operadores do governo acertavam com os governadores o apoio da sua bancada.
Em seguida, liberavam a emenda.
O dinheiro chegava na ponta e o governador (e a empreiteira) fazia o acerto com seus deputados.

Esse mesmo modelo foi aplicado para derrotar o ex-presidente Itamar Franco na convenção do PMDB que pretendia lança-lo como candidato à presidência da República. A operação foi articulada pelo então Ministro dos Transportes de FHC, Eliseu Padilha.

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O chamado “mensalão” foi fruto do amadorismo inicial do PT.

FHC havia consagrado uma tecnologia de governabilidade apoiando o PSDB em um grande partido, o PFL, O PT decidiu fortalecer pequenos partidos. E o pacto passava por bancar os custos de campanha dos parlamentares. Deu no que deu.

Depois do escândalo, o PT fechou apoio do PMDB, aproximou-se do candidato a partido grande PSDB e passou a se valer da metodologia das emendas parlamentares, tal e qual o governo FHC.

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Agora se tem os dois principais partidos do país – PT e PSDB – recorrendo a métodos de cooptação que precisam ser revistos. Esse mesmo modelo é aplicado em Brasília e em São Paulo.

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Durante algum tempo justificou-se esse modelo. O país iniciava o aprendizado democrático e a questão da governabilidade era relevante, especialmente depois de um governo (José Sarney) que andou toda sua gestão na corda bamba e outro (Fernando Collor) que perdeu o mandato.

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Mas já é hora de se aprimorar a democracia brasileira. Ao tentar tirar casquinha da situação, FHC não colabora para esse aprimoramento. Nem Lula, ao minimizar o episódio.

Há um modelo imperfeito, que torna os governos reféns e, ao mesmo tempo, cooptadores de partidos políticos, assim como os parlamentares reféns dos financiadores de campanha.

O episódio será positivo se ajudar a deflagrar uma ampla discussão sobre o modelo político, a formação de partidos, o financiamento privado de campanha, a questão das emendas parlamentares. Se usado oportunisticamente, o país não terá nada a ganhar com o episódio.

terça-feira, 21 de agosto de 2012

Ultradireita manda em parlamentares do PMDB e influencia o STF, afirma jornalista

20/8/2012 13:15, Por Redação - do Rio de Janeiro
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O deputado Jilmar Tatto é lider do PT na Câmara e quer ouvir o depoimento de Policarpo Jr. no plenário da CPMI do Cachoeira

“Na terça-feira 14, de posse de uma análise preparada por técnicos da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do Cachoeira a partir de interceptações telefônicas e documentos da Polícia Federal, o deputado Dr. Rosinha (PT-PR) estava pronto para um embate e tanto: requerer a convocação do jornalistaPolicarpo Jr., diretor da revista (semanal de ultradireita) Veja em Brasília. Seria a segunda tentativa da CPMI de ouvirPolicarpo, mas o PT decidiu retirar o assunto de pauta, por enquanto, até conseguir convencer o PMDB a participar da empreitada. Antes, o senador Fernando Collor (PTB-AL) havia tentado sem sucesso convocar o jornalista”. O texto é do jornalista Leandro Fortes, na edição desta semana da revista semanal de esquerda Carta Capital.

Segundo o redator da matéria, intitulada Os protetores do antijornalismo, o discurso de que o depoimento de Policarpo Jr. seria um atentado à liberdade de imprensa trata-se, na realidade, de uma “falácia”.

Leia, agora, os principais trechos da matéria:

“O documento de mais de 100 páginas elaborado por técnicos da CPI, publicado em seus principais detalhes na edição passada de Carta Capital, prova de diversas maneiras a ligação de Policarpo Jr. com o bicheiro Carlinhos Cachoeira, a quem o diretor da semanal da Editora Abril chegou a solicitar um grampo ilegal contra o deputado Jovair Arantes (PTB-GO).

“Na segunda-feira 13, um dia antes da data prevista para Dr. Rosinha se manifestar, uma tensa reunião ocorrida na casa do deputado Jilmar Tatto (SP), líder do PT na Câmara, tornou possível dimensionar a força do lobbyda Abril sobre a bancada de quatro deputados do PMDB na comissão. O grupo atendia aos apelos do vice-presidente da República, Michel Temer, presidente do partido, e do deputado Henrique Eduardo Alves, líder da sigla na Câmara.

“Constrangidos, incapazes de articular uma desculpa coerente, os peemedebistas da CPI continuam a negar apoio ao PT na empreitada. Na reunião, voltaram a se prender à falsa tese dos riscos da convocação à “liberdade de imprensa” no país. Eram eles os deputados Luiz Pitiman (DF) e Iris de Araújo (GO) e os senadores Sérgio de Souza (PR) e Ricardo Ferraço (ES).

“Não há, obviamente, nenhuma relação entre um jornalista depor em uma CPI e um suposto atentado à liberdade de imprensa. No caso de Policarpo Jr., o argumento soa ainda mais esdrúxulo, uma vez que o jornalista já depôs na Comissão de Ética da Câmara, em 22 de fevereiro de 2005, no processo de cassação do ex-deputado André Luiz (PMDB-RJ).

“Policarpo lá esteve, como voluntário, para defender ninguém menos que Cachoeira, a quem André Luiz pretensamente queria subornar para evitar a inclusão do nome do bicheiro no relatório final de outra CPI, a da Loterj (estatal fluminense de loterias), na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.

“Na casa de Tatto, a defesa da liberdade de imprensa foi o bastião dos peemedebistas. Do lado do PT, além do anfitrião e de Dr. Rosinha, estavam os deputados Odair Cunha (MG), relator da comissão, e Emiliano José (BA) e o senador José Pimentel (CE). Por mais de uma hora, os petistas revezaram-se na argumentação baseada tanto no documento preparado pelos técnicos da comissão quanto na reportagem de Carta Capital. Pouco adiantou. O PMDB não tinha ido negociar, apenas reforçar a orientação de Temer e Alves.

“Sem o PMDB, o PT jamais conseguirá convocar Policarpo Jr. ou qualquer outro figurão da mídia nacional, embora se trate de um partido da base governista e tenha o vice-presidente nos quadros do governo Dilma Rousseff. A posição de Temer sobre o assunto é mais do que conhecida, embora as razões ainda sejam obscuras. Há três meses, ele se reuniu separadamente em jantares no Palácio do Jaburu, residência oficial do vice em Brasília, com Fábio Barbosa, presidente da Editora Abril e braço direito do dono da empresa, Roberto Civita, e com João Roberto Marinho, vice-presidente das Organizações Globo. A ambos prometeu que o PMDB iria barrar a convocação de jornalistas.

“No caso de Alves, há uma razão empresarial e outra política para o parlamentar potiguar se curvar aos interesses do baronato da mídia. A família Alves é dona do Grupo Cabugi, que detém os direitos de retransmissão da TV Globo no Rio Grande do Norte. Além disso, Alves pretende ser o próximo presidente da Câmara, o que dificilmente conseguirá, se virar alvo de uma campanha na mídia, Veja à frente.

“Causa estranheza, contudo, o grau de submissão dos integrantes do PMDB na CPMI do Cachoeira aos interesses pessoais dos caciques do partido. Embora tenham cautela de não se pronunciar em público a respeito, é certo que a maioria é a favor da convocação de Policarpo Jr. A tese do atentado à liberdade de imprensa, de tão risível, nem sequer é considerada seriamente pelo grupo, que só tem coragem de sustentá-la em reuniões fechadas, ainda assim com a ressalva de seguirem a orientação do partido.

“A oposição – DEM, PSDB e PPS – trabalha em absoluta sintonia com os interesses da Editora Abril, e mesmo entre os governistas o assunto é tabu. A principal voz a se levantar contra a ida de Policarpo à CPMI, aliás, vem da base.

“Em tom alarmista, o deputado Miro Teixeira (PDT-RJ) tem alertado a quem quiser ouvir do perigo de o Brasil se transformar em um Estado policial caso o diretor da revista seja obrigado a explicar por que recebia encomendas e fazia pedidos ao bicheiro. “A intimidação, a coação, poderá ir ao plano estadual, ao plano municipal”, desesperou-se o deputado.

“Teixeira equivoca-se. Como se pode comprovar na investigação no Reino Unido das malfeitorias cometidas por jornalistas do grupo de comunicação do magnata Rupert Murdoch, o que realmente ameaça a liberdade de imprensa e a democracia é a união entre jornalismo e bandidagem.

“Irritado, o líder do PT argumentou que a ida de Policarpo Jr. à CPI em nada ameaçava a mídia livre. “Trata-se de convocar um senhor que começa a envergonhar a categoria dos jornalistas”, disse Tatto. Frustrado por nem poder colocar em pauta a convocação do jornalista, Dr. Rosinha desabafou: ‘Criou-se uma casta de intocáveis na CPI. Podemos convocar deputados e governadores, mas não jornalistas envolvidos com o crime organizado’.

“Sobre o assunto, a velha mídia tratou em notinhas esparsas. Andou mais preocupada com os humores do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, cujo nome apareceu na lista do mensalão tucano, em Minas Gerais, como beneficiário de 150 mil reais. Segundo o jornal O Estado de S. Paulo, Mendes pediu à Procuradoria-Geral da República para abrir inquérito contra CartaCapital, autora da denúncia.

“O ministro não nega ter recebido o dinheiro, mas o fato de que, na época, em 1998, fosse advogado-geral da União. Na lista, a referência a Mendes aparece ao lado da sigla AGU, provavelmente por ele trabalhar na Subchefia de Assuntos Jurídicos da Casa Civil da Presidência, órgão ligado à Advocacia-Geral. Não se sabe por que o ministro decidiu usar o Ministério Público para lhe advogar de graça, numa causa privada.

Condenação sem provas

Em outro texto do jornalista Leandro Fortes, desta vez, publicado em uma rede social, nesta segunda-feira, a ação da mídia de direita e de extrema-direita teria também o poder de influenciar na decisão dos juízes do Supremo Tribunal Federal quanto à Ação Penal 470, no processo apelidado de ‘mensalão’. Segundo o comentário do jornalista, “o único e verdadeiro drama do julgamento do ‘mensalão’ diz respeito a uma coisa que todo mundo já sabe: não há uma única prova contra o ex-ministro José Dirceu na denúncia apresentada ao STF pelo procurador-geral da República Roberto Gurgel. Nada. Nem uma única linha. Nem um boletim de ocorrência de música alta depois das 22 horas. Nadica de nada. Mas, sob pressão da mídia, o STF tem que condenar José Dirceu”.

“Pode até condenar os outros 36 acusados. Pode até mandar enforcá-los na Praça dos Três Poderes. Mas se não condenar José Dirceu, de nada terá valido o julgamento. A absolvição de José Dirceu, único caminho possível a ser tomado pelos ministros do STF com base na denúncia de Gurgel, irá condenar seus acusadores de forma brutal e humilhante. Quilômetros de reportagens, matérias, notas e colunas irão, de imediato, descer pelo ralo por onde também irá escoar um sem número de teses do jornalismo de esgoto.

“A absolvição de José Dirceu irá jogar a mídia sobre o STF como abutres sobre carne podre com uma violência ainda difícil de ser dimensionada. Algo que, tenho certeza, ainda não se viu nesse país. Vai fazer a campanha contra José Dirceu parecer brincadeira de ciranda.

“Por isso, eu não duvido nem um pouco que José Dirceu seja condenado sem provas, com base apenas nesse conceito cafajeste do “julgamento político” – coisa a que nem o ex-presidente Fernando Collor de Mello foi submetido.

“Para quem não se lembra, ou prefere não se lembrar, apesar de afastado da Presidência da República por um processo de impeachment, Collor foi absolvido pelo STF, em 1992. O foi, justamente, porque a denúncia do então procurador-geral da República, Aristides Junqueira, era uma peça pífia e carente de provas. Como a de Roberto Gurgel”, conclui.

domingo, 19 de agosto de 2012

O esquema Cachoeira e o governo Serra

da revista IstoÉ

CPI e Ministério Público investigam como o grupo do bicheiro Carlinhos Cachoeira atuou em São Paulo através de contratos da construtora Delta com a Prefeitura e o Estado em obras na marginal TietêPedro Marcondes de Moura

CONEXÃO
Em conversas telefônicas, Cachoeira (acima) fala sobre
contratos públicos em São Paulo nas gestões de Serra e Kassab



Os desdobramentos da Operação Monte Carlo, que investiga as relações do bicheiro Carlinhos Cachoeira com governos estaduais e municipais, chegaram ao principal bunker da oposição: o Estado de São Paulo. Em Brasília, parlamentares que compõem a “CPI do Cachoeira” já tiveram acesso a conversas telefônicas gravadas com autorização judicial entre junho do ano passado e janeiro deste ano. Elas apontam que a construtora Delta, braço operacional e financeiro do grupo do contraventor, foi favorecida nas gestões de José Serra (PSDB) e de seu afilhado político Gilberto Kassab (PSD) na prefeitura e também quando o tucano ocupou o governo do Estado. Em 31 de janeiro deste ano, por exemplo, Carlinhos Cachoeira telefona para Cláudio Abreu, o representante da empreiteira na região Centro-Oeste, atualmente preso sob a acusação de fraudar licitações e superfaturar obras. Na ligação (leia quadro na pág. 43), o bicheiro pergunta se Abreu teria conversado com Fernando Cavendish, oficialmente o dono da construtora, sobre “o negócio do Kassab”. Em seguida, diz a Abreu que o prefeito de São Paulo “triplicou o contrato”. Essa conversa, segundo membros da CPI e do Ministério Público de São Paulo, é um dos indícios de que a organização de Cachoeira também teria atuado com os tucanos e seus aliados em São Paulo. “Os depoimentos de Cachoeira e Abreu serão fundamentais para que se descubra o alcance das relações entre a empreiteira e políticos”, diz o relator da CPI, deputado Odair Cunha (PT-MG).

A Delta começou a prestar serviços à capital paulista em 2005, quando Serra assumiu o comando do município. Inicialmente, os contratos somavam R$ 11 milhões. A partir de 2006, quando Serra deixou a prefeitura e venceu as eleições para governador, os negócios da empreiteira com o município se multiplicaram, em muitos casos sem licitação. Em 2010, ano em que o tucano disputou a Presidência, os repasses chegaram a R$ 36,4 milhões. Entre 2008 e 2011, os pagamentos da prefeitura para a Delta ultrapassaram R$ 167 milhões. O que chama mais a atenção da CPI e do Ministério Público de São Paulo, porém, é o fato de a Delta ter vencido em outubro do ano passado uma concorrência para limpeza urbana no valor de R$ 1,1 bilhão. O MP abriu um inquérito para apurar se houve fraude na licitação. Há suspeitas de uso de documentos falsos e de edital dirigido. “Se a Delta cometeu essas irregularidades em outros Estados e municípios, precisamos apurar se isso ocorreu também em São Paulo”, diz o promotor Silvio Marques, do Patrimônio Público. Na quarta-feira 2, ele encaminhou ofício à PF, solicitando acesso às investigações da Operação Monte Carlo.



Entre a papelada, o promotor receberá a transcrição de uma conversa gravada com autorização judicial ocorrida em 4 de agosto do ano passado. No diálogo, a que ISTOÉ teve acesso, um homem identificado como Jorge pergunta para Gleyb Ferreira, segundo a PF uma espécie de “faz-tudo” de Cachoeira, sobre o edital de uma licitação. “E aí, evoluiu aquele negócio?”, pergunta Jorge. “Aguardamos estar com o edital hoje à tarde. O Carlinhos (Cachoeira) quer que a gente converse com o Heraldo (Puccini Neto, representante da Delta na região Sudeste). Já estamos conseguindo uma prorrogação com o secretário para o dia 31 ao invés do dia 15”, responde Gleyb. Para a PF, o diálogo se refere à concorrência de R$ 1,1 bilhão vencida pela empresa ligada ao bicheiro. O Ministério Público já apurou que foram necessários dois editais para a concorrência. No primeiro, a Delta foi desclassificada.

Se a Delta multiplicou seus contratos com a prefeitura entre 2005 e 2011, um movimento semelhante ocorreu com o governo de São Paulo, quando Serra chegou ao Palácio dos Bandeirantes em janeiro de 2007. Durante o mandato do tucano, a construtora recebeu R$ 664 milhões do governo paulista. O valor corresponde a 83% de todos os 27 convênios firmados pela Delta com o Estado de São Paulo na última década. A obra mais polêmica é a ampliação da Marginal Tietê, um dos cartões de visita da campanha presidencial de Serra em 2010. Além de inúmeros problemas, como atrasos e falta de compensação ambiental, o valor pago ao consórcio Nova Tietê, liderado pela Delta, sofreu um reajuste de 75%. Na quarta-feira 2, o Ministério Público de São Paulo instaurou Inquérito Civil para apurar a existência de irregularidades na licitação, superfaturamento e conluio entre agentes públicos.


ELE DE NOVO
Então diretor da Dersa, Paulo Preto, o polêmico arrecadador tucano em 2010,
foi o responsável por contratar a construtora Delta para obras viárias em São Paulo

Segundo documentos obtidos por ISTOÉ, a obra da Marginal era acompanhada dentro do governo de São Paulo por Delson José Amador e Paulo Vieira de Souza, conhecido como Paulo Preto, que no PSDB é identificado como um dos arrecadadores das campanhas eleitorais de Serra. Tanto Paulo Preto como Amador são citados na Operação Castelo da Areia, da Polícia Federal, por suposto envolvimento com empreiteiras. Pelo lado da Delta, o responsável pelo gerenciamento da obra era o diretor da empreiteira para a região Sudeste, Heraldo Puccini Neto. Ele está foragido, após ter a prisão preventiva decretada por envolvimento em suposto esquema de fraude em licitações na área de transporte público do Distrito Federal. “A apuração sobre os contratos da Delta com o governo paulista pode levar ao caixa 2 dos tucanos em São Paulo”, afirma o deputado estadual João Paulo Rillo (PT). “Não podemos nos limitar a fazer uma análise política”, diz o líder tucano Álvaro Dias (PR). “Devemos checar todos os contratos da Delta para saber de que forma foram celebrados e se os preços praticados foram justos. Afinal, a empresa foi a principal patrocinadora da relação do bicheiro Cachoeira com os recursos públicos.”


NOVO INQUÉRITO
O MP de São Paulo encontrou indícios de conluio entre agentes públicos e
a construtora Delta para fraudar licitacões em obras realizadas na capital
paulista. O promotor vai investigar contratos da gestão Kassab (abaixo)






Colaborou Claudio Dantas Sequeira

quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Mensalão & Luiz Gushiken: A crônica de uma injustiça

É oportuno lembrar a contundente frase dita por Luiz Gushiken em sua carta dirigida ao presidente Lula, em 16/11/2006, no momento em que se despedia do governo: “Na voragem das denúncias, abalou-se um dos pilares do Estado de Direito, o da presunção de inocência, uma vez que a mera acusação foi transformada no equivalente à prova de culpa”.


Washington Araújo, na Carta Maior

No cipoal de delitos, ilicitudes e crimes sob julgamento no Supremo Tribunal Federal, objeto da Ação Penal 470 – afetivamente distinguida pela imprensa como mensalão –, a sua maior parte não resiste a uma simples busca por provas e evidências que façam jus ao estardalhaço com que o assunto vem manipulando corações e mentes, e despertando paixões claramente partidárias nos meios de comunicação.

Mas existe outra selva de ilegalidades pairando como sombra sobre esta AP-470: a forma escancarada com que pessoas de reputação bem abaixo do meio-fio recebem aura de credibilidade inconteste, seja na condição de delator, seja na de testemunha em sua dupla função de réu de crime confesso. Essa credibilidade recebe a moldura vistosa de uma imprensa que há muito deixou de se pautar pelos requisitos basilares do bom jornalismo – aquele que busca a verdade, que persegue os fatos, que é incansável em ouvir os vários lados envolvidos e que se abstém de exarar julgamento de valor antes que o tema investigado tenha reunido os elementos básicos que respondam de forma inequívoca a questões tão simples e essenciais à nossa atividade quanto: Quem? Onde? Quando? O quê? Por quê? Como? Quanto?

Caixa dois

Chega a ser irônico, não fosse gravíssimo do ponto de vista moral e ético, que a grande imprensa que insiste em meter os pés pelas mãos em sua sua incontida pretensão de trocar a função de jornalista pela de magistrado, mudando como em passe de mágica as mangas de camisa por pomposas togas, é a mesma imprensa que usa todos os meios ao seu dispor – e não são poucos, desde plantação de notas contendo ameaças de demolição de reputações até o prenúncio de nova avalancha de infundados escândalos – para evitar que jornalistas de revistas semanais como Veja (Grupo Abril) e Época (Grupo Globo) venham a depor na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que investiga as nebulosas transações financeiras, escutas ilegais, aliciamento de parlamentares do Congresso Nacional, empresários de alto coturno e, também, o uso de informações obtidas – de forma criminosa, via escutas telefônicas – para abastecer noticiário apocalíptico com o intuito não menos criminoso de desestabilizar o governo de um país.

É a velha história se renovando: investigação boa é a que atinge os outros, que lhes macula a honra, expõe-lhe as vísceras na pedra dos mercados públicos, imputam-lhes crimes imaginários que causam repulsa à sociedade; e a investigação que não pode nunca existir é a que trata das relações ilícitas entre jornalistas e proprietários de seus abonados veículos de comunicação com o submundo do crime, tão próprios para regimes de exceção, para tempos ditatoriais, funcionando como vasos comunicantes de interesses sórdidos travestidos de informação. Nesse aspecto, o julgamento da AP-470 não passa de mero instrumento burocrático requerido pela grande mídia para dar validação às suas muitas teses de condenação às dezenas de réus indiciados em processo movido pelo Ministério Público da União.

Onde as provas? Ao longo de cinco longas horas o procurador-geral da República Roberto Gurgel, no dia 3 de agosto, leu calhamaço em que há excesso de juízos de valor e completa ausência de fatos probatórios. Na melhor das hipóteses, os depoimentos por ele pinçados com mãos de cirurgião plástico dentre as 50.506 páginas dessa Ação Penal recebem peso completamente indevido – o de prova material, violentando as mais rudimentares lições de Direito que aprendemos ainda nos primeiros meses de universidade.

Perguntam as pessoas que acompanham o julgamento, movidas pela curiosidade que somente tema com tão ampla repercussão midiática poderia suscitar: onde as provas? A vasta maioria dos depoimentos, colhidos às centenas nos autos da AP-470, são praticamente unânimes em desmentir, não confirmar, desacreditar por completo as teses da existência de crimes como formação de quadrilha, peculato, lavagem de dinheiro e compra de votos de parlamentares de forma regular e sistemática para atender a interesses políticos do governo federal com os parlamentares da Câmara dos Deputados e do Senado Federal. Muito ao contrário, os defensores dos réus referenciam essa enxurrada de depoimentos como robustas defesas dos seus clientes e, no máximo, encontramos a assunção de um crime quase comum a todos os partidos a que estão afiliados muitos dos réus: a prática do caixa dois durante a campanha presidencial de 2002.

Sem provas

Antes mesmo de se encerrar o julgamento do século, segundo querem fazer crer os órgãos de comunicação, encontramos o pisoteamento da justiça com requintes de crueldade, tortura sistemática, midiática e psicológica, movida contra, ao menos, uma pessoa inteiramente inocente. Tenho em mente a figura honrada e sempre altiva de Luiz Gushiken. O que o Ministério Público da União fez contra Luiz Gushiken é, por si só, um grave caso de má-fé mancomunado com injustiça patente. O que a grande imprensa fez com Luiz Gushiken é suficiente para escrever uma das páginas mais vis de nossa história recente: o ataque, o ataque sem provas, o ataque sem provas nem evidências plausíveis contra alguém que só teve um crime. O crime de ajudar o Brasil deixar para trás um longo passado de obscuridade e atraso civilizatório, de imensa disparidade entre poucos ricos e muitos pobres, e que ousou, bem além de nosso tempo, distinguir que a primeira etapa de qualquer governo popular não poderia ser outra que a de reconstruir a autoestima do povo.

Sim, a vítima do duplo massacre MP-mídia é mentor e patrono da mais importante campanha de publicidade institucional jamais ocorrida no Brasil – “O orgulho de ser brasileiro”, “O melhor do Brasil é o Brasil”, “Sou brasileiro e não desisto nunca”.

Luiz Gushiken demonstrou como ninguém, e ao longo de sete longuíssimos anos, tempo em que – vítima de terrível doença – sempre travou batalhas diárias por sua vida, que tem orgulho de ser brasileiro, que é um brasileiro talhado para não desistir nunca. Porque Gushiken há muito aprendeu com o pensador Shoghi Effendi (1897-1957) que “o maior tesouro de uma nação é o seu povo”. Portanto, o melhor do Brasil não são suas imensas fontes de recursos naturais, rios e florestas, imensa extensão territorial, petróleo abundante na camada do pré-sal. O melhor mesmo é o brasileiro.

Antes que os refletores deixem de buscar biografias dignas de serem iluminadas no episódio do mensalão, é necessário trazer a lume a “situação kafkiana processual” em que Gushiken foi engolfado. A começar pelo início, deve se destacar que a denúncia contra Gushiken foi recebida com votação apertada: quatro ministros da Suprema Corte – Celso de Mello, Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Eros Grau – votaram no sentido de sua rejeição. Dentre os que votaram favoráveis à recepção da denúncia, ficou patente que não havia elementos mínimos a embasar a condenação. E é de ninguém menos que do próprio ministro relator Joaquim Barbosa o entendimento de que, à luz dos elementos constantes dos autos, “absolveria Luiz Gushiken, sem dúvida”.

Sob a claridade desses primeiros raios de luz incidindo sobre o ambiente de penumbra em que nasceu a AP-470, é importante destacar qual acusação pesava sobre Gushiken: teria ele, pretensamente, ordenado ao também réu desta Henrique Pizzolato que assinasse quatro notas que permitiram o adiantamento de recursos da empresa Visanet, ligada ao Banco do Brasil, para a agência de publicidade de propriedade de Marcos Valério, a DNA Propaganda Ltda.

Recebida a denúncia, de forma tão apertada, passou-se à fase seguinte – a que busca, demonstra e apresenta as provas que sustentem a denúncia. Nesse aspecto o assunto chega a ser constrangedor: tudo condiz para a total improcedência da ação penal contra Luiz Gushiken. Isso porque o próprio Ministério Público não requereu a produção de uma única prova que pudesse robustecer seu pleito condenatório. E também não arrolou uma única testemunha que trouxesse alguma substância, algum resquício de veracidade à destrambelhada acusação.

Ato de desumanidade

Não estamos aqui às voltas com um processo com características dignas do talento de Franz Kafka, autor dos consagrados O Processo e O Castelo? Mas o assunto está longe de se exaurir. É que sobressaem atitudes bastante questionáveis por parte do Ministério Público quanto aos fatos e reveladoras da improcedência da ação penal, contra Gushiken. Uma destas é o fato de o titular do MP optar por subtrair ao conhecimento dos réus e dos ministros que compõem o Supremo Tribunal Federal o teor de laudo do Instituto de Criminalística produzido antes da sessão de julgamento que recebeu a denúncia, que cuidava do tema e se afigurava mais que suficiente para afastar quaisquer indícios de coautoria por parte de Gushiken.

Esse laudo assumiu ares de clareza e transparência uma vez que nomeava quem eram os responsáveis, no Banco do Brasil, pela gestão dos recursos da empresa Visanet – e entre eles sequer estava o réu Henrique Pizzolato; E, não estando este, restava evidente ser absolutamente fantasiosa, além de claramente mentirosa, a afirmação de Pizzolato de que recebera orientação de Gushiken para que agisse em benefício da agência de publicidade de Marcos Valério.

Neste instante, qualquer concretude capaz de manter de pé a aviltante denúncia do Ministério Público ruía por terra, deixando, no entanto, graves sequelas na honorabilidade um inocente: “Como devolver ao travesseiro todas as penas lançadas aos ventos da calúnia e da difamação?” E não precisava ser assim. Sim, porque se o então Procurador Geral da República Antonio Fernando de Souza não houvesse ocultado do STF (e dos réus) o referido laudo do Instituto de Criminalística, dificilmente a Suprema Corte teria atuado pelo recebimento da denúncia, uma vez que já existiam eloquentes elementos para sua imediata rejeição.

Triste o país em que a administração da justiça é tratada de forma no mínimo leviana e arbitrária: é fato que após a apresentação da defesa pelos réus, o procurador-geral da República argumentou – em resposta à defesa que revelou estranheza diante do fato de ter sido Luiz Gushiken denunciado – que os fatos estariam sendo “apurados” pelo Ministério Público. No entanto, não tardou muito para o cidadão comum ficar ciente que nos autos da AP-470 não havia quaisquer traços, indícios, pontos ou vírgulas dando conta dos resultados dessa “apuração”. Mas, para o réu injustamente acusado, era como se séculos houvessem transcorrido. Porque para o inocente, cada dia a mais em que sua honra deixa de ser restabelecida ela é reiteradamente pisoteada. Essa forma de agir do Ministério Público da União é, antes de tudo, um flagrante ato de desumanidade, pois transformou o próprio processo em sua cruel punição.

Aos leitores que conhecem os meandros da administração da justiça, resta concluso que o MP se absteve de buscar uma única prova voltada à condenação de Gushiken – nem antes de propor a ação, nem depois de recebida a denúncia. E, tanto tempo decorrido, tanto sofrimento vivido, ficamos sabendo que o atual procurador-geral da República proclamou expressamente que não haveria provas sequer indiciárias em desfavor de Gushiken.

Tentação maior

E quanto à imprensa? Florestas de papel foram consumidas para atear fogo na reputação de uma pessoa inocente. Colunistas se revezavam em proferir sumárias condenações; responsáveis nos jornais pelos quadros “Entenda o caso... como nós o entendemos” devem ter se cansado de destacar seu nome dentre os “delinquentes que tanto mal causaram ao país” e de repetir pela milésima vez a foto desse senhor de estatura mediana e olhos puxados que, com humildade e percepção da real condição humana, nos ensinou que não pode existir virtude mais amada e necessária nos dias em que vivemos do que a luz que irradia do sol da justiça.

É oportuno lembrar a contundente frase dita por Luiz Gushiken em sua carta dirigida ao presidente Lula, em 16/11/2006, no momento em que se despedia do governo: “Na voragem das denúncias, abalou-se um dos pilares do Estado de Direito, o da presunção de inocência, uma vez que a mera acusação foi transformada no equivalente à prova de culpa”.

Se no ora distante 2006 essas palavras, impulsionadas por genuína indignação contra o mau jornalismo, não passavam de longo e solitário grito no deserto, agora, em 2012, elas assumem ares de profecia cumprida. O próprio processo foi a punição. E, para uma imprensa ávida de sangue e sempre disposta a terçar armas para manter em evidência seu escândalo da hora, não restou nem a obrigação ética de formular ao “condenado inocente” um reles pedido de desculpas. O mau jornalismo principia na confusão mental entre liberdade de expressão e libertinagem de imprensa, e não resiste à tentação maior de vestir a toga e, a seu bel-prazer, acusar, julgar, condenar.

Não passam, na verdade, de semiprofissionais do jornalismo. Infames, biltres e, em uma palavra, mequetrefes.

*Washington Araújo é jornalista e escritor. Mestre em Comunicação pela
UNB, tem livros sobre mídia, direitos humanos e ética publicados no Brasil,
Argentina, Espanha, México.

Fonte: Carta Capital (Artigo publicado originalmente no Observatório da Imprensa)

terça-feira, 14 de agosto de 2012

Bandeira de Mello diz que "Mensalão foi conluio da imprensa para derrubar o presidente Lula"

"Enquanto não houver censura, teremos essa violência"

Por Elton Bezerra


A imprensa de forma geral e a televisão, especialmente, induzem à violência e levam a população a acreditar em uma falsa realidade, como acontece com o caso do "mensalão". A corajosa opinião é do jurista Celso Antonio Bandeira de Mello em entrevista à ConJur. “Enquanto existir televisão e não for permitida a censura, nós vamos ter a continuidade dessa violência e as crianças vão assistir violência”, disse o advogado, um tanto constrangido e receoso pelo impacto da declaração que dá, com uma ressalva: ele defende a censura de costumes, não a ideológica. O respiro, afirma, é a internet, que permite encontrar diversas abordagens sobre o mesmo assunto. “Não preciso ficar escravizado pelo que diz a chamada 'grande imprensa'”, diz.

Dita por qualquer outro advogado, a frase poderia indicar contradição ao vir de alguém que tem por dever de ofício defender a liberdade. Mas é conhecida a aversão do célebre professor pelos principais veículos de comunicação do país. É para a imprensa que ele aponta o dedo ao falar sobre o mensalão. Sua interpretação é que houve um conluio dos órgaos da grande imprensa para derrubar o então presidente Lula. É a mesma culpada, segundo ele, da influência deletéria sobre o Supremo Tribunal Federal. “Acho muito ruim decidir de acordo com a imprensa”.

Bandeira de Mello já deixou sua marca no Supremo. A ele é atribuída a indicação do sergipano Carlos Ayres Britto para a vaga de ministro aberta com a aposentadoria do também nordestino Ilmar Galvão. Sobre seu papel na sucessão, ele faz mistério, mas não esconde a amizade de 40 anos com o atual presidente do STF, deixando transparecer que o amigo chegou à mais alta corte do país por sua indicação e pela do professor Fabio Konder Comparato, da Faculdade de Direito da USP, outro conhecido acadêmico de esquerda.

Ácido, o professor há quase quatro décadas na PUC-SP atira contra a formação dos advogados, que em sua avaliação sofrem com a formação deficiente, fruto da expansão desenfreada dos cursos de Direito. “Quando se incorpora uma grande multidão, perde-se em sofisticação.”

Leia a entrevista:

ConJur — Como o senhor vê o processo do mensalão?
Celso Antônio Bandeira de Mello − Para ser bem sincero, eu nem sei se o mensalão existe. Porque houve evidentemente um conluio da imprensa para tentar derrubar o presidente Lula na época. Portanto, é possível que o mensalão seja em parte uma criação da imprensa. Eu não estou dizendo que é, mas não posso excluir que não seja.

ConJur − Como o senhor espera que o Supremo vá se portar?
Bandeira de Mello − Eu não tenho muita esperança de que seja uma decisão estritamente técnica. Mas posso me enganar, às vezes a gente acha que o Supremo vai decidir politicamente e ele vai e decide tecnicamente.

ConJur − O ministro Eros Grau disse uma vez que o Supremo decidia muitos casos com base no princípio da razoabilidade e não com base na Constituição. O que o senhor acha disso?
Bandeira de Mello − Pode até ser, mas eu acho que muitas vezes quem decide é a opinião pública.

ConJur – E o que o senhor acha disso?
Bandeira de Mello – Péssimo. A opinião pública é a opinião da imprensa, não existe opinião pública. Acho muito ruim decidir de acordo com a imprensa.

ConJur – E como o senhor avalia a imprensa?
Bandeira de Mello − A grande imprensa é o porta-voz do pensamento das classes conservadoras. E o domesticador do pensamento das classes dominadas. As pessoas costumam encarar os meios de comunicação como entidades e empresas cujo objetivo é informar as pessoas. Mas esquecem que são empresas, que elas estão aí para ganhar dinheiro. Graças a Deus vivemos numa época em que a internet nos proporciona a possibilidade de abeberarmos nos meios mais variados. Eu mesmo tenho uma relação com uns quarenta sites onde posso encontrar uma abordagem dos acontecimentos do mundo ou uma avaliação deles por olhos muito diversos; que vai da extrema esquerda até a extrema direita. Não preciso ficar escravizado pelo que diz a chamada grande imprensa. Você pega a Folha de S.Paulo e é inacreditável. É muito irresponsável. Eles dizem o que querem, é por isso que eu ponho muita responsabilidade no judiciário.

ConJur – O que o Judiciário deveria fazer?
Bandeira de Mello − Quando as pessoas movem ações contra eles, contra os absurdos que eles fazem, as indenizações são ridículas. Não adianta você condenar uma Folha, por exemplo, ou umaVeja a pagar R$ 30 mil, R$ 50 mil, R$ 100 mil. Isso não é dinheiro. Tem que condenar em R$ 2 milhões, R$ 3 milhões. Aí, sim, eles iriam aprender. Do contrário eles fazem o que querem. Lembra que acabaram com a vida de várias pessoas com o caso Escola Base? Que nível de responsabilidade é esse que você acaba com a dignidade das pessoas, com a vida das pessoas, com a saúde das pessoas e fica por isso mesmo? Essa é nossa imprensa.

ConJur − O senhor é a favor da diminuição da maioridade penal?
Celso Antônio Bandeira de Mello − Não consigo ser porque a vida inteira eu fui contra, mas hoje eu balanço. Eu era firme como uma rocha, achava um absurdo, achava que era necessário dar boas condições de vida para as crianças. Claro que devemos fazer isso, mas enquanto existir televisão e não for permitida a censura, nós vamos ter a continuidade dessa violência e as crianças vão assistir violência.

ConJur − O senhor é a favor da censura na TV?
Bandeira de Mello − Sou absolutamente a favor. Sou contra a censura ideológica. Essa eu sou visceralmente contra. Mas a censura de costumes eu sou a favor.

ConJur − Como seria essa censura de costumes?
Bandeira de Mello − Todo mundo é [a favor], só que não tem coragem de dizer. Você é a favor de passar filmes pedófilos na televisão? Eu não sou. Mas se passasse você se sentiria como? Você é a favor de censurar. As pessoas não têm coragem de dizer, porque depois do golpe virou palavrão ser a favor da censura. Você é a favor que passe um filme que pregue o racismo, não importa que tipo de racismo, nem contra que povo? Todo mundo é a favor da censura, mas as pessoas não têm coragem de dizer por que não é politicamente correto.

ConJur − E a quem caberia exercer essa censura?
Bandeira de Mello − Não precisa ser de funcionário público. Um corpo da sociedade escolhido por organismos razoavelmente confiáveis, como a OAB e certas entidades de benemerência.

ConJur – Mas a censura não é vedada pelas leis do país?
Bandeira de Mello − Você diria que é proibido. Eu diria que não é tão proibido assim. Pegue a Constituição e veja o que ela diz a respeito da defesa da criança, inclusive na televisão. Portanto, seria perfeitamente possível, mas a palavra ficou amaldiçoada.

ConJur – Por que deveria haver censura?
Bandeira de Mello − A imprensa escolhe o que noticia e usa uma merda de argumento que diz o seguinte: “Nós não somos responsáveis por essas coisas, isso existe, são os outros que fazem isso. Só estamos contando, nada mais.” Se fosse por isso, a humanidade não teria dado um passo, porque a humanidade adorava ver os cristãos sendo devorados pelos animais ou os gladiadores se matando. A humanidade adorava ver as supostas feiticeiras sendo queimadas. A humanidade sempre gostou de coisas de baixo nível e vis. Dizer que tem gente que gosta de assistir esses programas ordinários não é argumento válido. Você diz esse mesmo argumento para passar e acabou. A imprensa poderia dar notícias de coisas maravilhosas. Existe muita gente boa, que fazem coisas excelentes. Não. Ela noticia só o que há de pior, e você fica intoxicado por aquilo no último grau.

ConJur − O senhor acha que a imprensa deveria ser obrigada a noticiar outras coisas?
Bandeira de Mello − Acho que não dá para tolher a liberdade das pessoas nesse nível. Deveria haver uma regulamentação da imprensa importante.

ConJur − Em todos os meios: impresso, eletrônico?
Bandeira de Mello − Todos. De maneira que os que trabalham, os empregados, deveriam ter uma participação obrigatória e importante. O dono do jornal, da televisão tem direito ao dinheiro daquele lugar, mas não às opiniões. Porque do contrário não há mais a liberdade de pensamento. Há liberdade de meia dúzia de caras. O pensamento é dos que produzem o jornal, é dos jornalistas. Não é um problema de censura, é um problema de não entregar o controle a uma meia dúzia de famílias. Abrir para a sociedade, abrir para os que trabalham no jornal, ou na rádio ou na televisão, para que eles possam expressar sua opinião. E haver, sim, um controle ético de moralidade e impedir certas indignidades.

ConJur − Algum exemplo de uma indignidade cometida pela imprensa?
Bandeira de Mello − Mostrar crianças sendo torturadas ou mostrar corpos dilacerados. Isso incentiva [a violência], sim. O ser humano não é bonzinho. Você não tem que incentivar a maldade. Porque os EUA são desse jeito? Eles exportam para nós tudo o que há de pior. A boa imagem dos EUA no mundo quem dá é o cinema. Porque o cinema deles tem coisas muito humanas, muito boas também. Para cá vem o lixo, o povo gosta do lixo.

ConJur − Como o senhor vê as relações entre os homens?
Bandeira de Mello − O fato de ser racional não faz o homem diferente dos animais que vivem em manada, que têm um cabeça que guia e os outros vão atrás. Na sociedade humana é igual, há os que pensam, e eles são poucos; os outros parecem que pensam, mas não pensam, repetem. Eles não têm coragem de pensar. E se cada uma resolvesse pensar, já imaginou o caos que viria a ser? O mundo tem que ser assim, alguns pensam e os outros acompanham o pensamento. Nós vivemos um período em que é a escória que pensa, que dirige. Mas claro que sempre existem seres notáveis que lutam contra a escória e dizem o que deve ser feito. São seres humanos maravilhosos.

ConJur – Como o senhor vê a advocacia hoje?
Bandeira de Mello − Na hora que se incorporou uma grande multidão é evidente que você vai perdendo sofisticação. Na verdade são dois raciocínios: você pode dizer que da quantidade sai a qualidade, o que também é verdade. Ao mesmo tempo em que você baixa [a qualidade] de certo lado, você propicia o surgimento de expoentes que não seriam vistos se não tivesse sido ampliada em muito a oportunidade.

ConJur − E a OAB?
Bandeira de Mello − Eu não sou encantado com a atual gestão.

ConJur − Algum motivo?
Bandeira de Mello – Talvez seja injusto dizer isso. Se for comparar com homens como Seabra Fagundes, que já foi presidente, com Raymundo Faoro, fica difícil, certo? Foram homens notáveis. Foram pessoas que tiveram oportunidade de liderar porque o país passou por momentos difíceis e precisava de homens extraordinários. Agora vivemos momentos de normalidade. Talvez eu não esteja sendo justo com o nosso atual presidente, porque precisa ver o momento histórico em que ele está exercendo a presidência.

ConJur − A OAB pode ser considerada uma autarquia?
Celso Antônio Bandeira de Mello − É uma autarquia.

ConJur − Por quê?
Bandeira de Mello − É uma autarquia especial, que deve ter muita liberdade e é tratada de maneira muito diferente de qualquer outra autarquia. Veja que em um dos poderes do Estado, o Judiciário, obrigatoriamente membros da OAB fazem parte da banca examinadora. A OAB tem legitimidade ativa para ações diretas de inconstitucionalidade. A OAB é considerada por lei um serviço público. Entre as finalidades dela está defender a ordem democrática. A OAB é uma autarquia muito especial. Tem que ter muita independência para cumprir muito bem o papel dela.

ConJur − E em relação ao Supremo? Como o senhor vê a atuação da mais alta corte do país?
Bandeira de Mello - Nosso atual Supremo é melhor que o anterior. Não que eu não veja grandes problemas no Supremo porque em tudo isso há um erro: o fato de os ministros serem vitalícios.

ConJur − Isso é um problema?
Bandeira de Mello − Grave. Uma vez eu ouvi de um membro do supremo a seguinte frase: “Professor, tantas vezes nos chamam de excelência que a gente acaba pensando que é excelência mesmo”. Oito anos de mandato seria mais que o suficiente. O supremo devia ter um mínimo de [ministros] provenientes da magistratura de carreira. E não tem praticamente ninguém. Agora cresceu com a escolha dessa senhora [Rosa Weber], que é de carreira. Mas na verdade, tem muita gente do Ministério Público, da Advocacia. Tem que ter, mas não pode ser maioria. Porque diga−se o que quiser dos juízes, eles são treinados desde o comecinho para pelo menos tentar ser imparcial. Você não precisa ter simpatia pelos votos daquele juiz, mas você reconhece que ele é sério, dedicado, esforçado, conhece aquilo que está falando, e você respeita. Há juízes no Supremo que são absolutamente independentes, assim como há uns que você diz: que lástima, como é que está lá?

ConJur − O senhor poderia indicar quem são?
Bandeira de Mello − Claro que não.

ConJur – O STF legisla?
Bandeira de Mello − Essa é uma maneira reacionária de encarar. Ele [STF] não tem posição de legislador nenhum. Agora se o legislador não faz a lei e o STF tem que decidir, ele vai fazer o que? Tem que decidir seguindo os princípios da Constituição e as normas constitucionais, é o dever. Se cabe alguma crítica a isso é ao Legislativo. Não sei qual é o pior dos Poderes da República, mas eu penso que é o Legislativo. O Legislativo é uma lástima pela péssima qualidade dos seus membros, sem prejudicar figuras notáveis lá dentro.

ConJur − Recentemente o seu nome foi citado em algumas reportagens colocando-o como intermediário de um encontro entre o ex-presidente Lula e o ministro Ayres Britto.
Bandeira de Mello − Isso é coisa típica da imprensa. O Lula nunca foi íntimo meu, nunca foi. Em segundo lugar, se alguém pensasse que eu iria fazer a cabeça do ministro Ayres Britto é porque é tonto. O ministro Ayres Britto é um homem absolutamente independente, inteligente e muito culto. Vê lá se eu conseguiria fazer a cabeça do Carlos? E vê lá se eu ousaria tentar fazer a cabeça do Carlos? Se você respeita um amigo, você tem que saber qual é o seu limite. Você não pode falar para o cara fazer isso ou aquilo. No entanto, a Folha de S.Paulo disse que eu fui contratado para aliciar o ministro Carlos Britto no caso daquele italiano...

ConJur − Cesare Battisti?
Bandeira de Mello − Cesare Battisti. [A Folha] Teve a petulância de dizer isso de mim. Eu diria: que lixo. No meu pensamento eu diria: que merda de jornal é esse que duas mulherezinhas escrevem isso de mim? Como se eu fosse capaz de fazer isso. Ainda disse que eu fui contratado. Eu não fui contratado, eu dei gratuitamente um parecer. Gratuitamente. O advogado, que era o Barroso, me telefonou e falou: “Celso, você daria um parecer sobre um caso, você se sente à vontade, você está de acordo com a tese? Só que eu não vou ter dinheiro para te pagar por ele”. Falei que não era caso de dinheiro. Devia ser visto como consciência cívica. Esse homem na Itália corria um risco terrível, se levassem esse homem para lá. Ele foi julgado à revelia praticamente. Aquele julgamento foi uma vergonha, foi na base da delação premiada que os outros caras o acusaram. No tempo do golpe, quando os militantes eram torturados eles procuravam apontar para alguém que estava fora do país, para não correr risco. Ele [Battisti] estava fora do país e disseram que foi ele que atirou. Ele estava na França naquela época, e os caras disseram que foi ele.

ConJur − Como o senhor viu a decisão do Supremo no caso?
Bandeira de Mello − Não terminou tão bem quanto eu gostaria. Mas acabou reconhecendo que é o presidente quem deveria decidir, que era a decisão correta. E justamente o ministro Carlos Britto, que eles disseram que eu tinha sido contratado para aliciar, foi o que votou contra.

ConJur − Vocês são amigos ainda hoje?
Bandeira de Mello – Muito. Nós somos amicíssimos, não só amigos. O Carlos é meu amigo há mais de quarenta anos, e foi meu aluno também.

ConJur − O senhor foi consultado quando ele foi indicado ao Supremo?
Bandeira de Mello − Ele mesmo diz a quem quiser ouvir que fui eu quem indicou ele. Fomos duas pessoas, Fabio [Konder] Comparato e eu. Nós fomos falar com o presidente da República na época.

ConJur – Em relação ao direito administrativo, que é a sua área, como que o senhor vê a Lei de Licitações hoje?
Bandeira de Mello − Ela está sendo dilacerada. Eles juntam um pedaço daqui com um pedaço de lá. Mas ela foi um grande progresso. A Lei de Licitações não é tão ruim quanto dizem. Ruim é essa lei feita para contratos de emergência para a Copa. Aliás, eu sou absolutamente contra a Copa no Brasil e a Olimpíada.

ConJur – O senhor se refere ao RDC, o Regime Diferenciado de Contratações?
Bandeira de Mello − Isso.

ConJur − Ele foi estendido recentemente para as obras do PAC. Como o senhor vê isso?
Bandeira de Mello − Acho um absurdo. É duro eu dizer isso porque a eleição da Dilma foi algo muito importante. Estou satisfeito com ela. Mas no governo dela foram feitas coisas muito... Por exemplo, as tais Parcerias Público Privadas. Isso no governo Lula é uma catástrofe. É um aprofundamento das privatizações. E essas medidas da Dilma são aprofundamentos de desmandos típicos do governo Fernando Henrique. É necessário dinheiro para coisas mais importantes: saúde e educação acima de tudo.

ConJur − O senhor então não acha necessário rever a lei de licitação?
Bandeira de Mello − Já estava na hora de fazer uma costurada nisso. Eu não vou dizer que está na hora porque a hora não é boa.

ConJur − Mas ela deveria ser revista em alguns pontos?
Bandeira de Mello − Ela precisava ser revista. Sabe que eu acho porque ela melhorou tanto? O pregão, que eu era contra, é uma coisa excelente.

ConJur − Por quê?
Bandeira de Mello − Dificulta o conluio dentre os participantes. Favorece uma coisa mais séria, é tudo feito ali, em voz alta, em público.

ConJur − O senhor inicialmente era contra?
Bandeira de Mello − Totalmente. Era um conservantismo inconsciente. Era uma novidade, fiquei meio suspeitoso.

ConJur − E em relação ao RDC, o que o senhor critica nele?
Bandeira de Mello − Tudo, acho que está tudo errado.

ConJur − A começar por onde?
Bandeira de Mello − A começar por permitir que alguém faça o próprio projeto base e depois participe da licitação. A começar por isso.

ConJur − Qual a diferença em relação à Lei de Licitações?
Bandeira de Mello − Na Lei de Licitações, quem faz o projeto não pode disputar a licitação. Ele pode ter disputado a licitação para fazer o projeto, mas não para fazer a obra.

ConJur − O senhor tem uma definição para o que é interesse público?
Bandeira de Mello − Interesse público é o interesse que os cidadãos têm enquanto membros da sociedade. Por sermos membros da sociedade, nenhum de nós tem interesse de ser desapropriado, mas todos nós temos interesse que exista o título da desapropriação. Nenhum de nós tem interesse em ser multado, mas cada um de nós tem interesse que existam as multas de trânsito, por exemplo.

ConJur − Na época do governo FHC havia um grande número de ações por improbidade administrativa, e de certa forma, durante o governo do PT isso deu uma diminuída. O senhor acha que o Ministério Público amadureceu, houve alguma mudança?
Bandeira de Mello − No governo do Fernando Henrique houve muita corrupção, e essas ações eram uma demonstração disso. Houve corrupções confessadas, por exemplo, foi gravado o senhor Fernando Henrique dizendo que podia usar o nome dele numa licitação. O que aconteceu com ele? Nada. Ele está endeusado pela imprensa. Nada. O senhor Menem andou uma temporada na cadeia, o senhor Fujimori está [na prisão] até hoje, e com ele [FHC] nem isso aconteceu. Não estou dizendo que era para ele ir para a cadeia ou não. Mas foi um crime e não aconteceu nada. Olha os dois pesos e duas medidas. Pegaram aquele italiano [Salvatore Cacciola] e meteram na cadeia. Ele ficou algum tempo e agora está solto.

ConJur – E no governo Lula?
Bandeira de Mello − As pessoas podem dizer o que quiserem a respeito dele, mas só não se podem renegar fatos: 30 milhões de pessoas foram trazidas das classes D e E para as classes B e C. Basta isso para consagrar esse homem como o maior governante que esse país já teve na história. Mas não só isso. Foi, portanto, a primeira vez que começaram a ser reduzidas as desigualdades sociais, que a Constituição desde 1988 já mandava. E veja outro fenômeno tão típico: olha o ódio que certos segmentos da classe média têm deste governante, deste político. É profundo, visceral. É o ódio daqueles que não suportam alguém de origem mais modesta estar equiparado a ele.

ConJur − Como o senhor vê a sucessão no STF, com a proximidade da aposentadoria dos ministros Ayres Britto e Cezar Peluso?
Bandeira de Mello − Não tenho a menor expectativa a respeito de quem vem e quem não vem. Claro que eu queria um candidato, todo mundo sempre tem um. Mas o que eu penso não interessa.

ConJur − O senhor já leu as poesias do ministro Ayres Britto?
Bandeira de Mello − Claro. Gosto delas. São poesias despretensiosas como ele. O Carlos é uma pessoa maravilhosa, não é só um grande ministro, um grande juiz, um grande constitucionalista. Ele fez mestrado em Direito Constitucional com um ex-assistente meu, Celso Bastos. O Carlos eu já conhecia e fez Direito Administrativo, que era cadeira obrigatória, comigo. Nós já tínhamos um relacionamento pessoal muito bom. À noite em casa o Carlos tocava violão. Ele é um ser humano maravilhoso, e isso é a coisa mais importante que existe. Ele é uma pessoa para se tirar o chapéu. Se eu fosse espírita, diria que o Carlos não reencarna mais. Ele vai direto, de tão perfeito que é.

Elton Bezerra é repórter da revista Consultor Jurídico.

Revista Consultor Jurídico, 12 de agosto de 2012

Folha é condenada por interpretação errada de decisão

Por Alessandro Cristo
Do Consultor Jurídico
Uma coisa é a mera exposição objetiva, ainda que em tom crítico, dos fatos reais. Muito diferente, porém, é a atribuição indevida a alguém de palavras e juízos de valor que implicam imputação de crime. Principalmente quando esse “alguém” é um juiz. O entendimento é da 6ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, que julgou a favor de Apelação de delegado contra a Empresa Folha da Manhã S/A, que publica o jornal Folha de S.Paulo, e os jornalistas André Caramante e Rogério Pagnan.

O delegado Luis Augusto Castilho Storini ajuizou ação pedindo indenização por danos morais devido a reportagens do jornal que, segundo ele, divulgaram informações falsas e difamatórias e usaram indevidamente sua imagem (Leia as reportagens abaixo). Ele afirmou terem sido atribuídas, pelaFolha, à juíza que conduziu a instrução do processo “falsas afirmações e juízos de valor”. Nesta quinta (9/8), o tribunal reverteu decisão de primeiro grau e condenou os réus a pagar R$ 10 mil em indenização por danos morais.

Storini foi representado pelo advogado Ronaldo Tovani. A Folha foi defendida pela advogada Mônica Filgueiras da Silva Galvão.

As reportagens foram publicadas nos dias 14 e 21 de agosto de 2009, e em 24 de janeiro de 2010. As duas primeiras tiveram os títulos: “Acusados de fraude na saúde ‘somem’ de investigação” e “Sumiço de nomes em investigação é apurado”. Na terceira, o delegado aparece em fotografia com a legenda “alguns exemplos de (delegados) afastados ou investigados na polícia de SP”.

Titular da Unidade de Inteligência do Departamento de Polícia Judiciária da capital paulista, o delegado Storini foi o responsável pela operação Parasitas, que em 2008 investigou irregularidades na Secretaria estadual da Saúde. A Polícia Civil chegou a prender cinco acusados de fraudar licitações em hospitais públicos da Prefeitura de São Paulo e do governo do estado, e de outros 29 municípios no Rio, Minas Gerais e Goiás.

Segundo as reportagens, o delegado teria favorecido as empresas Embramed e Halex Istar, investigadas na operação. Notícia publicada no dia 14 de agosto de 2009 afirmou que, segundo o Ministério Público, as duas empresas seriam alvo de inquéritos sob responsabilidade do delegado, mas que certidões obtidas pelo jornal confirmavam que as empresas não eram investigadas. Na denúncia apresentada à Justiça, segundo a Folha, foram acusadas 13 pessoas e seis pequenas empresas, mas não as consideradas “peças-chave” no suposto esquema.

No dia 21 de agosto de 2009, a Folha publicou texto em que informava a abertura de investigação contra o delegado, e citou trecho da decisão da juíza da 2ª Vara Criminal Daniela Martins de Castro Mariani Cavallanti, que, segundo o texto, considerou anormal a "ausência de indicação expressa dos nomes das empresas e seus sócios". Ainda segundo o jornal, documentos sobre o “sumiço” das empresas foram entregues ao então procurador-geral de Justiça, Fernando Grella Vieira, ao então delegado-geral da Polícia Civil, Domingos Paulo Neto, e à então corregedora da Polícia Civil, Maria Inês Trefiglio Valente, que abriram investigação contra o delegado.

Para o relator do caso, desembargador Alexandre Lazzarini, a primeira reportagem não violou os direitos de personalidade do delegado, por haver simples exposição de fatos, “ainda que de forma crítica, o que não ultrapassa o mero exercício da atividade jornalística”, disse em seu voto. “A reportagem teve a preocupação de abrir espaço, permitindo ao ora apelante que se manifestasse a respeito dos fatos.”

Já na segunda reportagem, para o relator, os jornalistas não tiveram o mesmo cuidado, uma vez que a notícia, segundo ele, “extrapola o direito de crítica, com a utilização de informações incorretas e juízos de valor falsamente imputados à magistrada condutora do processo crime”. Em informações enviadas à 6ª Câmara, a juíza Daniela Cavallanti “esclareceu que não concedeu qualquer entrevista aos corréus, bem como não autorizou a publicação de decisão”, afirma o desembargador em seu voto. Ele diz que a juíza não reconheceu as opiniões expressadas na reportagem.

“Tal reportagem, portanto, ultrapassa os limites da função jornalística, que é de informar à coletividade fatos e acontecimentos, de maneira objetiva, sem alteração da verdade, resvalando nos direitos de personalidade do autor”, disse o desembargador. “Mais grave do que a divulgação de fatos inverídicos, é a atribuição à autoridade julgadora de falsos juízos de valor, sendo evidente, em tal caso, o potencial lesivo da conduta (…), diante do imenso número de leitores do periódico de grande circulação.”

Lazzarini considerou abusiva também a publicação de foto do delegado para ilustrar reportagem sobre delegados investigados. “A divulgação da imagem e do nome do apelante, em destaque, em reportagem que, embora trate de delegados afastados ou investigados, não indica todos os profissionais que se enquadram em tal situação, implica exposição pública desnecessária e atentatória à honra e imagem”, escreveu. Para ele, mesmo que seja verídico o fato de o delegado ser investigado, a exposição causou “desgaste moral e psicológico”.

No entanto, a Câmara rejeitou o pedido de publicação da íntegra da decisão pelo jornal, uma vez que a regra que previa esse tipo de medida, a Lei de Imprensa, foi considerada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal. Segundo Lazzarini, a publicação da sentença nada tem a ver com o direito de resposta previsto no artigo 58 da Lei 9.504/1997, a Lei das Eleições.

A Folha, por sua vez, pediu a manutenção da sentença de primeiro grau, da 19ª Vara Cível da capital paulista, que negou a ação entendendo ter havido exercício regular da atividade jornalística. Pediu também a condenação do delegado por litigância de má-fé e que fossem riscadas expressões injuriosas da petição no recurso. Ambos os pedidos foram negados.

Participaram do julgamento os desembargadores Vito Guglielmi e Percival Nogueira, que seguiram o voto do relator.

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Lista de Furnas: Deputados do PSDB acusados de pressionar lobista preso

6/8/2012 20:21, Por Redação - de Belo Horizonte
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Nilton Monteiro reconhece a veracidade da Lista de Furnas

Relato do lobista Nilton Antonio Monteiro, preso na Penitenciária da Gameleira, nesta capital, reproduzido na página do jornal eletrônico mineiroNovo Jornal, acusa parlamentares tucanos de o pressionar para que não fale sobre a “Lista de Furnas”, como ficou conhecido o esquema de corrupção investigado pela Polícia Federal durante o governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, montado para financiar campanhas políticas e o enriquecimento ilícito de seus operadores.

Leia, aqui, a íntegra da matéria:

“Em tempos obscuros da democracia brasileira Graciliano Ramos, detido pela Polícia Política do regime então vigente escreveu uma obra prima da literatura nacional, Memórias do Cárcere. Mesmo sem o talento do escritor, o lobista Nilton Antonio Monteiro narra o mix de terror, pressão, dinheiro e poder a envolver notadamente o primeiro período em que ele foi preso.

“De acordo com (…) documentos autenticados página por página para oNovo Jornal, ‘o fato foi determinado ao delegado Márcio Nabak por influência do atual deputado federal por Minas Gerais Eduardo Brandão de Azeredo (PSDB), do atual secretário de Governo, Danilo de Castro, da juíza Rosimeire das Graças do Couto, do promotor Adriano Botelho Estrela, da promotora Rita de Cássia Mendes Rolla, do ex-presidente da OAB Seção de Minas Gerais, advogado Raimundo Cândido Júnior, do empresário e ex-deputado federal Vittorio Medioli, do ex-tesoureiro de campanha do senador Eduardo Azeredo, Cláudio Mourão, do empresário Antônio Pontes Fonseca, proprietário da Calsete Siderúrgica Ltda., na cidade de Sete Lagoas e integrantes da Felipe Amodeo Advogados Associados’.

“Para Nilton Antonio Monteiro, a entrada do delegado Márcio Nabak na história, substituindo o colega dele João Otacílio Silva Neto na qualidade de chefe do Deoesp, ‘teve exatamente a finalidade de tentar desqualificar aLista de Furnas’, além de desqualificá-lo pessoalmente.

“O lobista faz uma acusação grave ao afirmar que antes de ser preso o delegado Nabak, já substituindo João Otacílio, lhe fez ‘uma proposta milionária dizendo-se portador da cifra de cinco milhões de reais provenientes dos cofres de Vittorio Medioli, Antônio Pontes Fonseca e Felipe Amodeo, para ser dividido entre os dois, para que todos os problemas fossem encerrados’, principalmente o caso a envolver a Lista de Furnas.

“Para a viabilização do pretendido bastava a Nilton Antonio Monteiro reconhecer como falsa a Lista de Furnas, o que teria gerado sérias conseqüências para o deputado estadual mineiro Rogério Corrêa, do Partido dos Trabalhadores – PT – e mais pessoas ligadas a ele. Nilton afirmou não poder aceitar a proposta, ‘pois a lista é reconhecidamente autêntica’.

“Além disso, o delegado Márcio Nabak pediu todos os documentos envolvendo o secretário Danilo de Castro. Principalmente o que consta o nome de José Tasso de Oliveira, ex-diretor da Espírito Santo Centrais Elétricas S/A – Escelsa.

“Nilton acusa a autoridade policial de ter desaparecido com peças do inquérito e salienta que fez, sem sucesso, denúncias à Corregedoria da Polícia Civil, à Fazenda Pública e ao Ministério Público de Minas Gerais.

“A primeira prisão dele ‘ocorreu na porta da Corregedoria no dia 20 de outubro de 2011, ligada à prisão, em Vila Velha, no Espírito Santo, de Maria Maciel de Souza, posteriormente transportada para Belo Horizonte’.

“Horror

“De acordo com Monteiro, primeiro os policiais foram com ele até a residência onde ele morava e depois o conduziram ao Deoesp onde foram feitos dois autos provisórios de apreensão de documentos. Na noite do mesmo dia, o prisioneiro foi conduzido para o Departamento de Investigações – DI.

“– Onde fiquei junto a 40 outros presos num ambiente imundo e nojento, todas as pessoas como eu dormindo no chão’.

“Pela manhã, o prisioneiro foi conduzido sob escolta para depor perante o delegado Márcio Nabak e o promotor Adriano Botelho Estrela, que Nilton Antonio Monteiro acusa de ‘pertencer ao grupo ligado ao secretário Danilo de Castro’. À noite, Nilton retornou ao DI onde dormiu. Foram lavrados mais dois autos de apreensão na presença do senhor promotor e com a assistência da defesa.

“À noite, conta o depoente, há horas tantas um grupo de policiais abriu a porta do xadrez e empurrou para dentro outro preso – segundo ele, um negro bastante forte.

“– Eu não conseguia dormir e estava atento, preocupado com toda a situação. O novo preso vasculhou todo o ambiente com o olhar e se dirigiu para o meu lado, me derrubando e pisando fortemente em meu pescoço. Pensei que ia ser morto.

“Mas os demais presos intervieram, gritaram muito e os policiais em serviço acabaram por retirar o agressor do local. Na opinião de Nilton Antonio Monteiro, ‘isso aconteceu a mando de alguém’. Ele confessa que o episódio o deixou bastante abalado. Depois ele foi transferido para o Ceresp Gameleira, tendo ficado preso durante quatro meses antes de ser libertado para posteriormente ser novamente detido.

“Intervenção do Poder

“Ainda detido no Ceresp Gameleira, conta Nilton Antonio Monteiro, certa manhã ele foi retirado da cela para conversar com o delegado Márcio Nabak que voltou a fazer referência a uma proposta que tinha para lhe apresentar. Porém, antes de dizer do que se tratava pediu-lhe para acompanhá-lo a uma sala mais reservada onde estavam os deputados federais tucanos Rodrigo de Castro, filho do secretário Danilo de Castro, Marcos Pestana, ex-secretário estadual da Saúde no governo Aécio Neves, atual presidente do PSDB mineiro e Domingos Sávio, que foi líder da bancada do PSDB também no governo do atual senador por Minas Gerais.

“A conversa, segundo Monteiro, foi iniciada por Nabak afirmando-lhe que aquela era a última chance que ele teria para negar a autenticidade da Lista de Furnas em troca de uma deleção premiada capaz de comprometer o deputado estadual petista Rogério Correa e pessoas a ele ligadas.

“O depoente acusa o deputado Rodrigo de Castro, Mascos Pestana e Domingos Sávio de se referirem ao PT ‘como partido de bandidos’, ‘tendo Rodrigo argumentado que os petistas pagam muito bem. Marcos Pestana por sua vez queria saber de outros documentos que eu pudesse ter comigo, se algum envolvia o senador Aécio Neves. Rodrigo de Castro só queria saber de documentos envolvendo o nome do pai dele e se eu tinha algum tipo de ligação com o deputado estadual Durval Ângelo, do PT’. Foram muitas as insistências feitas, ‘sempre com o Márcio Nabak insistindo em delação premiada e afirmando que o deputado Rogério Correa é bandido’. Mas diante da resistência de Nilton Monteiro, ‘os deputados foram embora e eu voltei para a prisão’. Se Nilton Antonio Monteiro tivesse aceitado as condições do grupo seria chamado, como foi dito a ele o promotor Adriano Botelho, Estrela para testemunhar os procedimentos legais.

“– A respeito desse assunto eu escrevi para os deputados estaduais Rogério Correa e Durval Ângelo, informando o que tinha acontecido.

“Segunda prisão

A segunda prisão de Nilton Monteiro ocorreu nas dependências da Fazenda dos Parreiras, em posse do depoente, quando ele lá estava tratando de negócios envolvendo a propriedade e que ele discordava por entender que eram procedimentos “executados” para de alguma forma comprometê-lo.

“Ele conta que caminhava em companhia do seu sogro quando dois policiais saíram por detrás de árvores e lhe deram voz de prisão, não permitindo que ele, que estava sem camisa, pudesse pelo menos voltar na sede da fazenda para se trajar por completo. Foi algemado com as mãos para trás e conduzido a uma viatura descaracterizada. Nilton tem desconfianças de que um ex-funcionário da fazenda telefonou avisando os policiais que ele estava no local. Algemado, ele conta que foi ‘arrastado uns 200 metros’, sendo conduzido para a Delegacia de Venda Nova. Uma longa viagem.

“Antes de chegar à prisão, pelo menos por três vezes os policiais que o detiveram, sem exibir o devido mandado de prisão, pararam em locais variados e o deixaram sozinho no interior do veículo, dando-lhe ‘oportunidade de fuga’, o que ele em momento algum tentou, presumindo ser aquilo uma manobra para existir a oportunidade de execução sumária sob o argumento de tentativa de fuga. As saídas eram demoradas, perto de matagais e os policiais postados à distância que lhe permitiria tentar escapar, porém, sob o risco de tombar por disparos de armas de fogo potentes e de longo alcance. Em uma dessas paradas ele escutou um dos seus captores dizer: ‘O cabrito está preso’. Em outra ocasião os autores da prisão receberam um papel cujo conteúdo até hoje Nilton Monteiro não sabe do que se trata. Até então a sua prisão era caracterizada mais por arbitrariedades do que legalidades, principalmente a ausência de um advogado de defesa. No trajeto os policiais ainda foram à casa de um delegado no bairro Santa Amélia, ‘onde outro papel cujo teor eu também desconheço foi buscado’. De lá a viatura seguiu para Venda Nova.

‘Quando chegaram à Delegacia de Polícia de Venda Nova, eles me colocaram no ‘coró’ (cela na gíria dos presos comuns’. Nilton reclama que ficou muito tempo sem comer e só aí foi oferecido a ele um lanche que ele se recusou a comer ‘temendo ser envenenado’. Quando ia jogar o alimento ao lixo outro preso disse que comeria, mas Nilton o advertiu:

“– Se você quer comer que coma, mas se morrer envenenado eu não terei culpa nenhuma.

“Mesmo assim o preso se alimentou e nada aconteceu. Enquanto ele comia o telefone celular dele tocou e depois de terminada a conversa Nilton perguntou a ele se poderia usar o aparelho, o que foi consentido, oportunidade em que Monteiro se comunicou com a família para dizer que do momento da sua prisão até àquela hora estava sem a assistência de um advogado, sem camisa (apesar do tempo bastante frio) e sem comer. Monteiro ficou até aproximadamente meia noite em Venda Nova, horário em que foi transferido para o Deoesp onde dormiu algemado tanto nos pulsos quantos nas pernas, inclusive com a utilização de correntes nos tornozelos. Posteriormente Nilton Antonio Monteiro foi informado que ele não poderia ter dormido naquelas dependências e de outro fato bastante grave, sem ter sido submetido a um Auto de Corpo de Delito. Tais fatos já estão comunicados ao Conselho Nacional de Justiça – CNJ. Os mesmos episódios encontram-se relatados à Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados.

“Nilton Antonio Monteiro só foi transferido novamente para o DI depois dos policiais rodarem muito com ele por diversos lugares, já num domingo, quando a sua prisão ocorrera no sábado. Porém, nesse ínterim foi convocado a depor perante a delegada da Polícia Federal Josélia Braga da Cruz. Foi sugerido a Nilton Antonio Monteiro, pela delegada, a sua ida para o presídio de segurança máxima da Papuda, em Brasília, por questões de segurança e proteção de testemunha. Segundo ele, a delegada federal ‘desempenhou o seu papel com extremo profissionalismo’. Dela ouviu da impossibilidade de transferência para a Nelson Hungria, que abriga igualmente presos da esfera federal indo parar no complexo penitenciário de Neves onde ficou até 17 de maio de 2012 ‘sob intensa vigilância, porém, sem sofrer nenhum mau trato’. Ao contrário da PF, a polícia mineira pretendia que Nilton Antonio Monteiro ficasse detido no Departamento de Investigações – DI. Hoje as autoridades competentes estão redobrando cuidados para que nenhum tipo de agressão ocorra a ele e membros da sua família.

“Confirmação

“O deputado estadual Rogério Correa, do PT, confirmou estar protocoladas na Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais as cartas enviadas por Nilton Antonio Monteiro denunciando a trama que estava sendo armada, frisando que o seu colega Durval Ângelo também recebeu as mesmas informações. Além do mais, Rogério Correa disse ter encaminhado a denúncia ao Ministério Público de Minas Gerais ‘que não tomou providências’.

“Ele comenta que o delegado Márcio Nabak repassou à revista Vejainformações tentando incriminá-lo e posteriormente ao jornal O Estado de Minas, levando o deputado federal Domingos Sávio, (PSDB/MG), da cidade de Divinópolis, Centro Oeste de Minas, a pedir a cassação do mandato dele, Rogério.

“– Entretanto a situação era tão absurda que o próprio governo do Estado não conseguiu mobilizar a sua base, tendo vários parlamentares se rebelado contra a situação contra a qual se levantou também o presidente do Poder Legislativo, deputado Diniz Pinheiro.

“Lembrou ainda que foi de ‘valor inestimável’ a coragem do deputado Antônio Júlio, do PMDB, que declarou, através da mídia, que a Lista de Furnas é verdadeira, acrescentando ele próprio ter sido beneficiado ao comparecer pessoalmente perante Dimas Fabiano e receber o montante de R$ 200 mil.

“O representante petista disse ter sido informado também da visita feita pelos deputados federais Marcos Pestana, Domingos Sávio e Rodrigo de Castro ao Ceresp Gameleira para, a mando do senador Aécio Neves e do secretário Danilo de Castro, tentar com a colaboração do delegado Márcio Nabak obter de Nilton Antonio Vieira a sua implicação.

“A revista Veja está sendo processada, observa Rogério Corrêa. Quanto ao jornal O Estado de Minas, ele lembra que a Justiça já determinou o pagamento de multa e que o próximo passo, que a Lei prevê caso não lhe sejam assegurados os seus direitos, ‘é a prisão do diretor responsável’. Ele ainda estuda qual atitude irá tomar em relação ao delegado Márcio Nabak. ‘O caso é idêntico! O mesmo que Policarpo fez com Calinhos Cachoeira, tentaram repetir aqui em Minas’.

Consultado, o deputado Marcus Pestana respondeu: ‘O fato narrado nunca ocorreu e deve ser mais uma fantasia do estelionatário Nilton Antônio Monteiro. É uma grosseira e deslavada mentira. Portanto, tal fato inexistente envolvendo um conhecido falsário não merece comentários’.

“Os deputados Domingo Sávio e Rodrigo de Castro, igualmente consultados, nada responderam até o fechamento desta matéria.

“Ressaltando, contudo, que fica reservado aos mesmos o direito legal de acrescentarem a esta matéria suas versões.

“A Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), encarregada de apurar os fatos ocorridos e narrados através de correspondências enviadas do cárcere por Nilton Monteiro a seus integrantes, promete emitir nota a respeito.

“Novo Jornal entregou possível vídeo feito por celular do encontro para ser periciado.

“Nossa reportagem solicitou, sem sucesso, do Ceresp Gameleira a lista de presença dos visitantes do dia que possivelmente ocorreram os fatos denunciados.

“A Comissão Nacional de Direitos Humanos informa que requisitará as imagens de vídeo da entrada do presídio.

“A Comissão de Ética da Câmara dos Deputados informou que só se pronunciará sobre o fato após ser consultada oficialmente por quem de direito”.

A Lista de Furnas foi recentemente denunciada também pela revista semanal independente Carta Capital.

domingo, 5 de agosto de 2012

Dois pesos e dois mensalões

janio de freitas
DE SÃO PAULO

Na sua indignação com o colega Ricardo Lewandowski, o ministro Joaquim Barbosa cometeu uma falha, não se sabe se de memória ou de aritmética, que remete ao conveniente silêncio de nove ministros do Supremo Tribunal Federal sobre uma estranha contradição sua. São os nove contrários a desdobrar-se o julgamento do mensalão, ou seja, a deixar no STF o julgamento dos três parlamentares acusados e remeter o dos outros 35, réus comuns, às varas criminais. De acordo com a praxe indicada pela Constituição.

Proposto pelo advogado Márcio Thomaz Bastos e apoiado por longa argumentação técnica de Lewandowski, o possível desdobramento exaltou Barbosa: "Essa questão já foi debatida aqui três vezes! Esta é a quarta!" Não era. Antes houve mais uma. As três citadas por Barbosa tratavam do mensalão agora sob julgamento. A outra foi a que determinou o desdobramento do chamado mensalão mineiro ou mensalão do PSDB. Neste, o STF ficou de julgar dois réus com "foro privilegiado", por serem parlamentares, e remeteu à Justiça Estadual mineira o julgamento dos outros 13.

Por que o tratamento diferenciado?

Os nove ministros que recusaram o desdobramento do mensalão petista calaram a respeito, ao votarem contra a proposta de Márcio Thomaz Bastos. Embora a duração dos votos de dois deles, Gilmar Mendes e Celso de Mello, comportasse longas digressões, indiferentes à pressa do presidente do tribunal, Ayres Britto, em defesa do seu cronograma de trabalho.

A premissa de serem crimes conexos os atribuídos aos réus do mensalão petista, tornando "inconveniente" dissociar os processos individuais, tem o mesmo sentido para o conjunto de 38 acusados e para o de 15. Mas só valeu para um dos mensalões.

Os dois mensalões também não receberam idênticas preocupações dos ministros do Supremo quanto ao risco de prescrições, por demora de julgamento. O mensalão do PSDB é o primeiro, montado já pelas mesmas peças centrais -Marcos Valério, suas agências de publicidade SMPB e DNA, o Banco Real. Só os beneficiários eram outros: o hoje deputado e ex-governador Eduardo Azeredo e o ex-vice-governador e hoje senador Clésio Andrade.

A incoerência do Supremo Tribunal Federal, nas decisões opostas sobre o desdobramento, é apenas um dos seus aspectos comprometedores no trato do mensalão mineiro. A propósito, a precedência no julgamento do mensalão do PT, ficando para data incerta o do PSDB e seus dois parlamentares, carrega um componente político que nada e ninguém pode negar.

A Polícia Federal também deixa condutas deploráveis na história do mensalão do PSDB. Aliás, em se tratando de sua conduta relacionada a fatos de interesse do PSDB, a PF tem grandes rombos na sua respeitabilidade.

Muito além de tudo isso, o que se constata a partir do mensalão mineiro, com a reportagem imperdível de Daniela Pinheiro na revista "piauí" que chegou às bancas, é nada menos do que estarrecedor. O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, com seu gosto de medir o tamanho histórico dos escândalos, daria ali muito trabalho à sua tortuosa trena. Já não será por passar sem que a imprensa e a TV noticiosas lhes ponham os olhos, que o mensalão do PSDB e as protetoras deformidades policiais e judiciais ficarão encobertas.

É hora de atualizar o bordão sem mudar-lhe o significado: de dois pesos e duas medidas para dois pesos e dois mensalões.


Janio de Freitas, colunista e membro do Conselho Editorial da Folha, é um dos mais importantes jornalistas brasileiros. Analisa com perspicácia e ousadia as questões políticas e econômicas. Escreve na versão impressa do caderno "Poder" aos domingos, terças e quintas-feiras.