terça-feira, 25 de setembro de 2012

Até por chupetas e hidratantes Barbosa e Lewandowski se divergem

Por Carolina Brígido (carolina@bsb.oglobo.com.br) | Agência O Globo

BRASÍLIA - Dois vidros de óleo de amêndoas, um frasco de hidratante, duas chupetas e dois enxaguantes bucais. A conta do supermercado daria R$ 150. No entanto, Liliane Ribeiro dos Santos não passou pelo caixa e tentou levar as mercadorias. Foi presa em flagrante e obrigada a deixar tudo no local. Nesta terça-feira, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) concedeu um habeas corpus à ré para extinguir a ação penal. Entre os votos favoráveis ao benefício estava o de Joaquim Barbosa. Alegou o princípio da insignificância para inocentar a presa. Do outro lado, defendendo o rigor da lei, mesmo para pequenos furtos, estava Ricardo Lewandowski.

No julgamento, Lewandowski, que é revisor do processo do mensalão, disse que o STF é como um pronto-socorro: trata dos grandes crimes e também dos pequenos. Segundo ele, é preciso haver rigor com ambos os casos. O ministro ressaltou o fato de a ré já ter sido condenada outras vezes pelo mesmo crime. Segundo os autos do processo, Liliane já foi denunciada seis vezes por furto.

- Quando se trata dessa questão da insignificância, tenho feito as devidas distinções. Embora o furto tenha um valor econômico relativamente baixo, a paciente é uma criminosa habitual. Penso que nós não podemos estimular comportamentos desta espécie, reiterados - afirmou.

Segundo o ministro, se a Justiça relevar crimes menores, há o risco de a sociedade ficar decepcionada:

- Se o aparelho repressivo do Estado não der uma resposta, ainda que seja por um furto de pequena monta como este, a sociedade tenderá a fazer justiça com as próprias mãos. O que se vê hoje em todo o Brasil é o crescimento de guardas particulares quase substituindo a segurança do Estado. O comércio em geral esta se valendo de verdadeiros exércitos privados para defender-se contra os amigos do alheio, como se dizia antigamente.

Barbosa, que é relator do processo do mensalão, aproveitou a ocasião para afirmar que a sociedade se ofende muito mais com os chamados crimes do colarinho branco do que com casos como o de Liliane.

- Normalmente, em situações similares, eu sempre me inclino pela denegação da ordem, mas noto que trata-se de uma espécie de criminalidade da miséria. Roubo de chupetas! _ disse. _ Não considero que esse tipo de criminalidade seja a que mais ofenda a sociedade brasileira. A que mais ofende é a criminalidade de colarinho branco, que ofende o patrimônio público, para a qual até hoje a sociedade brasileira não encontrou a solução.

Celso de Mello, que concorda com Barbosa, fez de seu voto um discurso contra a corrupção.

- Isso tudo revela uma situação não de desespero, mas de desesperança. Certamente, uma jovem sem condições mínimas que lhe permitam alcançar coisas que outras pessoas possuem. Não que queiramos justificar a subtração patrimonial, temos que considerar o contexto social. Enquanto existem agentes estatais desviando milhões de reais e golpeando os cofres públicos eu acho extremamente severa uma justiça que se mostra dura com alguém que teria cometido o delito de furto simples em sua modalidade tentada. Este é um problema muito mais social do que penal. É um problema que deve estar na agenda do poder público não como repressão criminal, mas de apoio, de promoção - declarou.

Gilmar Mendes também defendeu o trancamento da ação penal. Um dos argumentos do grupo vitorioso foi o de que, em casos de contrabando de produtos até R$ 10 mil, o STF costuma aplicar o princípio da insignificância. Para Barbosa, significa que a Corte usa "dois pesos e duas medidas" para tratar criminosos. A relatora, Cármen Lúcia, ficou com Lewandowski. Para ela, a ré faz do crime "um meio de vida".

A tentativa de furto ocorreu em 28 de setembro de 2011 em Juiz de Fora (MG). A Justiça de Minas Gerais negou o pedido para trancar a ação penal sob o argumento de que a ré era reincidente. No entanto, concedeu-lhe a liberdade. Em 3 de maio deste ano, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que Liliane deveria continuar presa preventivamente e manteve aberta a ação penal. O caso chegou a STF em março deste ano. A relatora negou o pedido de liminar - que, depois, foi encaminhado à Segunda Turma da Corte.

Julgamento do mensalão no STF pode não valer

Por Luiz Flávio Gomes

Muitos brasileiros estão acompanhando e aguardando o final do julgamento do mensalão. Alguns com grande expectativa enquanto outros, como é o caso dos réus e advogados, com enorme ansiedade. Apesar da relevância ética, moral, cultural e política, essa decisão do STF —sem precedentes— vai ser revisada pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, com eventual chance de prescrição de todos os crimes, em razão de, pelo menos, dois vícios procedimentais seríssimos que a poderão invalidar fulminantemente.

O julgamento do STF, ao ratificar com veemência vários valores republicanos de primeira linhagem —independência judicial, reprovação da corrupção, moralidade pública, desonestidade dos partidos políticos, retidão ética dos agentes públicos, financiamento ilícito de campanhas eleitorais etc.—, já conta com valor histórico suficiente para se dizer insuperável. Do ponto de vista procedimental e do respeito às regras do Estado de Direito, no entanto, o provincianismo e o autoritarismo do direito latino-americano, incluindo, especialmente, o do Brasil, apresentam-se como deploráveis.

No caso Las Palmeras a Corte Interamericana mandou processar novamente um determinado réu (na Colômbia) porque o juiz do processo era o mesmo que o tinha investigado anteriormente. Uma mesma pessoa não pode ocupar esses dois polos, ou seja, não pode ser investigador e julgador no mesmo processo. O Regimento Interno do STF, no entanto (artigo 230), distanciando-se do padrão civilizatório já conquistado pela jurisprudência internacional, determina exatamente isso. Joaquim Barbosa, no caso mensalão, presidiu a fase investigativa e, agora,embora psicologicamente comprometido com aquela etapa, está participando do julgamento. Aqui reside o primeiro vício procedimental que poderá dar ensejo a um novo julgamento a ser determinado pela Corte Interamericana.

Há, entretanto, um outro sério vício procedimental: é o que diz respeito ao chamado duplo grau de jurisdição, ou seja, todo réu condenado no âmbito criminal tem direito, por força da Convenção Americana de Direitos Humanos (artigos 8, 2, h), de ser julgado em relação aos fatos e às provas duas vezes. O entendimento era de que, quem é julgado diretamente pela máxima Corte do País, em razão do foro privilegiado, não teria esse direito. O ex-ministro Márcio Thomaz Bastos levantou a controvérsia e pediu o desmembramento do processo logo no princípio da primeira sessão, tendo o STF refutado seu pedido por 9 votos a 2.

O ministro Celso de Mello, honrando-nos com a citação de um trecho do nosso livro, atualizado em meados de 2009, sublinhou que a jurisprudência da Corte Interamericana excepciona o direito ao duplo grau no caso de competência originária da corte máxima. Com base nesse entendimento, eu mesmo cheguei a afirmar que a chance de sucesso da defesa, neste ponto, junto ao sistema interamericano, era praticamente nula.

Hoje, depois da leitura de um artigo (de Ramon dos Santos) e de estudar atentamente o caso Barreto Leiva contra Venezuela, julgado bem no final de 2009 e publicado em 2010, minha convicção é totalmente oposta. Estou seguro de que o julgamento do mensalão, caso não seja anulado em razão do primeiro vício acima apontado (violação da garantia da imparcialidade), vai ser revisado para se conferir o duplo grau de jurisdição para todos os réus, incluindo-se os que gozam de foro especial por prerrogativa de função.

No Tribunal Europeu de Direitos Humanos é tranquilo o entendimento de que o julgamento pela Corte Máxima do país não conta com duplo grau de jurisdição. Mas ocorre que o Brasil, desde 1998, está sujeito à jurisprudência da Corte Interamericana, que sedimentou posicionamento contrário (no final de 2009). Não se fez, ademais, nenhuma reserva em relação a esse ponto. Logo, nosso país tem o dever de cumprir o que está estatuído no artigo 8, 2, h, da Convenção Americana (Pacta sunt servanda).

A Corte Interamericana (no caso Barreto Leiva) declarou que a Venezuela violou o seu direito reconhecido no citado dispositivo internacional, “posto que a condenação proveio de um tribunal que conheceu o caso em única instância e o sentenciado não dispôs, em consequência [da conexão], da possibilidade de impugnar a sentença condenatória.” A coincidência desse caso com a situação de 35 réus do mensalão é total, visto que todos eles perderam o duplo grau de jurisdição em razão da conexão.

Mas melhor que interpretar é reproduzir o que disse a Corte: “Cabe observar, por outro lado, que o senhor Barreto Leiva poderia ter impugnado a sentença condenatória emitida pelo julgador que tinha conhecido de sua causa se não houvesse operado a conexão que levou a acusação de várias pessoas no mesmo tribunal. Neste caso a aplicação da regra de conexão traz consigo a inadmissível consequência de privar o sentenciado do recurso a que alude o artigo 8.2.h da Convenção.”

A decisão da Corte foi mais longe: inclusive os réus com foro especial contam com o direito ao duplo grau; por isso é que mandou a Venezuela adequar seu direito interno à jurisprudência internacional: “Sem prejuízo do anterior e tendo em conta as violações declaradas na presente sentença, o Tribunal entende oportuno ordenar ao Estado que, dentro de um prazo razoável, proceda a adequação de seu ordenamento jurídico interno, de tal forma que garanta o direito a recorrer das sentenças condenatórias, conforme artigo 8.2.h da Convenção, a toda pessoa julgada por um ilícito penal, inclusive aquelas que gozem de foro especial.”

Há um outro argumento forte favorável à tese do duplo grau de jurisdição: o caso mensalão conta, no total, com 118 réus, sendo que 35 estão sendo julgados pelo STF e outros 80 respondem a processos em várias comarcas e juízos do país (O Globo de 15 de setembro de 2012). Todos esses 80 réus contarão com o direito ao duplo grau de jurisdição, que foi negado pelo STF para outros réus. Situações idênticas tratadas de forma absolutamente desigual.

Indaga-se: o que a Corte garante aos réus condenados sem o devido respeito ao direito ao duplo grau de jurisdição, tal como no caso mensalão? A possibilidade de serem julgados novamente, em respeito à regra contida na Convenção Americana, fazendo-se as devidas adequações e acomodações no direito interno. Com isso se desfaz a coisa julgada e pode eventualmente ocorrer a prescrição.

Diante dos precedentes que acabam de ser citados, parece muito evidente que os advogados poderão tentar, junto à Comissão Interamericana, a obtenção de uma inusitada medida cautelar para suspensão da execução imediata das penas privativas de liberdade, até que seja respeitado o direito ao duplo grau. Se isso inovadoramente viesse a ocorrer —não temos notícia de nenhum precedente nesse sentido—, eles aguardariam o duplo grau em liberdade. Conclusão: por vícios procedimentais decorrentes da baixíssima adequação da eventualmente autoritária jurisprudência brasileira à jurisprudência internacional, a mais histórica de todas as decisões criminais do STF pode ter seu brilho ético, moral, político e cultural nebulosamente ofuscado.

Luiz Flávio Gomes é advogado e professor. Fundador da Rede de Ensino LFG, diretor-presidente do Instituto de Pesquisa e Cultura Luiz Flávio Gomes. Acompanhe meu Blog. Siga-me no Twitter. Assine meu Facebook.

Revista Consultor Jurídico, 25 de setembro de 2012

sábado, 22 de setembro de 2012

Presidência da República
Secretaria de Comunicação Social
Secretaria de Imprensa

Nota oficial

Na leitura do voto, na sessão de ontem do Supremo Tribunal Federal, o senhor ministro Joaquim Barbosa se referiu a depoimento que fiz à Justiça, em outubro de 2009. Creio ser necessário alguns esclarecimentos que eliminem qualquer sombra de dúvidas acerca das minhas declarações, dentro dos princípios do absoluto respeito que marcam as relações entre os Poderes Executivo e Judiciário.

Entre junho de 2001 e fevereiro de 2002, o Brasil atravessou uma histórica crise na geração e transmissão de energia elétrica, conhecida como “apagão”.

Em dezembro de 2003, o presidente Lula enviou ao Congresso as Medidas Provisórias 144 e 145, criando um marco regulatório para o setor de energia, com o objetivo de garantir segurança do abastecimento de energia elétrica e modicidade tarifária. Estas MPs foram votadas e aprovadas na Câmara dos Deputados, onde receberam 797 emendas, sendo 128 acatadas pelos relatores, deputados Fernando Ferro e Salvador Zimbaldi.

No Senado, as MPs foram aprovadas em março, sendo que o relator, senador Delcídio Amaral, construiu um histórico acordo entre os líderes de partidos, inclusive os da oposição. Por este acordo, o Marco Regulatório do setor de Energia Elétrica foi aprovado pelo Senado em votação simbólica, com apoio dos líderes de todos os partidos da Casa.

Na sessão do STF, o senhor ministro Joaquim Barbosa destacou a ‘surpresa’ que manifestei no meu depoimento judicial com a agilidade do processo legislativo sobre as MPs. Surpresa, conforme afirmei no depoimento de 2009 e repito hoje, por termos conseguido uma rápida aprovação por parte de todas as forças políticas que compreenderam a gravidade do tema. Como disse no meu depoimento, em função do funcionamento equivocado do setor até então, “ou se reformava ou o setor quebrava. E quando se está em situações limites como esta, as coisas ficam muito urgentes e claras”.

Dilma Rousseff
Presidenta da República Federativa do Brasil

sábado, 8 de setembro de 2012

STF julga ADIN contra nova lei da lavagem de dinheiro

Do site Revista Voto

A Confederação Nacional das Profissões Liberais – CNPL ajuizou uma Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI, no Supremo Tribunal Federal – STF. A Adin nº 4.841 foi distribuída, por sorteio, ao ministro Celso de Mello, que será o relator do caso.

Segundo a Lei nº 9.683, todo profissional liberal que preste, mesmo que eventualmente, serviços de assessoria, consultoria, contadoria, auditoria, aconselhamento ou assistência, de qualquer natureza, em operações de compra e venda de imóveis, estabelecimentos comerciais ou industriais ou participações societária de qualquer natureza, de gestão de fundos, de criação, exploração ou gestão de sociedades de qualquer natureza, financeiras, societárias ou imobiliárias e de contratos desportivos ou artísticos, deverão comunicar todos os atos ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras - COAF, à qual ficarão submetidos a um controle extraordinariamente rígido.

No entendimento da CNPL, a lei de lavagem de capitais não pode ser aplicada aos profissionais liberais em razão dos princípios constitucionais de proteção ao sigilo profissional. De acordo com o advogado da CNPL, Amadeu Garrido, a legislação prejudica a relação de trabalho entre os profissionais liberais e seus clientes, uma vez que vai contra os Estatutos e Códigos de Ética das mais diversas profissões.
A CNPL abrange 27 federações filiadas, mais de 600 sindicatos representantes de 51 profissões e de cerca de 10 milhões de profissionais em todo o País.

O tema é extremamente oportuno e vem gerando muita polêmica entre contadores, auditores, advogados, médicos, administradores e todos os profissionais liberais, por cercear o direito de liberdade.

sexta-feira, 7 de setembro de 2012

Festival Mundial da Paz leva 600 atrações ao Ibirapuera em São Paulo

Fernanda Cruz
Repórter da Agência Brasil

São Paulo – Para o Festival Mundial da Paz, que ocorre no Parque Ibirapuera, na capital paulista, foram montadas 25 tendas trazendo mais de 600 atividades, como oficinas, música, dança e palestras. O evento, que começou ontem (06) e vai até domingo (09), tem como proposta disseminar a cultura da paz na sociedade.

Nelma da Silva Sá, coordenadora geral do festival, conta que o objetivo da programação é trazer atrações que ajudem as pessoas a descobrir uma forma de compensar o stress do dia-a-dia. “Quando se descobre que atividades simples podem trazer equilíbrio, busca-se isso mais vezes durante as semanas malucas que se tem”, disse.

Nelma destacou que o festival aborda a paz em ações práticas do cotidiano. “A paz começa em mim. Não adianta sair por aí falando que o outro precisa ter paz”, completou.

Além de São Paulo, mais 18 estados brasileiros e países como França, Portugal, Argentina, México, Equador e Inglaterra recebem o Festival. Esta é a terceira edição do evento, que teve já como sede Florianópolis em 2006, com 15 mil pessoas, e Goiânia, 12 mil participantes, em 2009. Este ano, a organização do Festival, que é promovido pela Universidade Internacional da Paz (Unipaz), espera receber 200 mil pessoas até domingo.

Segundo Eduardo Shiguematsu, presidente do Conselho da Unipaz de Campinas, uma bandeira com milhares de pedaços de tecidos com mensagens de paz produzidas por quem passa pelo festival será costurada até domingo. “Ela simboliza a união da paz que contém em cada um de nós”, contou Shiguematsu.

Edição: José Romildo

AP 470 - Ministros do STF dizem não flexibilizar jurisprudência

Por Rafael Baliardo

O Supremo Tribunal Federal não está flexibilizando sua jurisprudência em ações criminais ao julgar a Ação Penal 470, o processo do mensalão, garantiu o ministro Gilmar Mendes, nesta quinta-feira (6/9), durante o julgamento do processo. Mendes respondeu a provocação do presidente da corte, ministro Ayres Britto, que disse ter lido nos meios de comunicação "que o Supremo estaria decidindo nessa causa de modo a se colocar quase que em rota de colisão com sua própria tradição de observância das garantia constitucionais do processo”.

Gilmar Mendes respondeu que o STF tem adotado a jurisprudência consolidada em outros julgamentos de processos relativos à corrupção. “Todos [os ministros] procuraram analisar o caso detidamente, fugindo a qualquer pretensão de adotar uma ideia de responsabilidade objetiva ou coletiva”, disse. “Tem se falado muito que violamos a jurisprudência da Ação Penal 307 [Caso Collor] sobre o ato de ofício”, lamentou.

Celso de Mello também defendeu a atuação do Supremo na condução do julgamento da Ação Penal 470. “O tribunal deixou claro então [na AP307] e voltou, ao meu juízo, a reafirmar agora que não há necessidade de que se pratique concretamente um determinado ato, mas, sim, que o ato que se busca seja um ato primeiro, que se inclua na esfera de atribuições funcionais do agente”, reiterou o decano da corte, ministro Celso de Mello.

Três condenados
A corte encerrou, nesta quinta-feira,o julgamento do item cinco da Ação Penal 470, condenando, pelo crime de gestão fraudulenta de instituição financeira, três executivos do Banco Rural. Apenas a ex-vice-presidente do banco, Ayanna Tenório foi absolvida. Na tarde desta quinta-feira, votaram os ministros Gilmar Mendes, Marco Aurélio, Celso de Mello e o presidente do tribunal, ministro Ayres Britto.

Ayanna Tenório foi absolvida apenas do crime de gestão fraudulenta. A ré responde ainda, junto com os outros três dirigentes do banco, por imputações referentes aos crimes de lavagem de dinheiro, evasão de divisas e formação de quadrilha. No entanto, como nove ministros disseram estar convencidos de que Ayanna Tenório, como recém contratada, não tinha sequer “condições técnicas” de interferir na renovação dos empréstimos fraudulentos, é improvável que a ré seja condenada por outros crimes.

A então presidente do Banco Rural Kátia Rabello e o ex-vice-presidente operacional José Roberto Salgado foram condenados por unanimidade. A ex-vice-presidente Ayanna Tenório foi absolvida por nove votos a um, e o atual vice-presidente da Vinícius Samarane foi condenado por oito votos a dois. O ministro relator Joaquim Barbosa foi o único que acolheu integralmente a acusação e condenar os quatro. Já o revisor, ministro Ricardo Lewandowski, acompanhado do ministro Marco Aurélio, votou pela absolvição de Ayanna e Samarane. Os sete outros ministros absolveram apenas Ayanna Tenório.

O ministro Gilmar Mendes, o primeiro a votar nesta quinta-feira, retomou aspectos abordados por outros ministros que o antecederam. O ministro citou como evidência dos crimes atribuídos aos réus o fato de as “concessões temerárias de crédito” terem ocorrido a partir de cadastros incompletos dos contraentes e por meio de “manobras contábeis e escriturais”, que maquiavam a não amortização dos empréstimos. Mendes observou, ainda, o risco assumido pelo banco ao incidir no não provisionamento de capital, dado o risco assumido com os empréstimos fraudulentos. Gilmar Mendes observou que, dessa forma, o banco incorreu na diminuição da liquidez e na descapitalização da instituição.

O ministro afirmou ainda que é farta a prova documental, inclusive de natureza técnica, trazida pelo Ministério Público e aproveitou para criticar o argumento da defesa de que as renovações de empréstimo, por não implicarem em nova injeção de recursos por parte do banco, eram procedimentos mecânicos, que dispensavam o juízo dos réus.

Críticas às fatias
Segundo a votar nesta quinta, o ministro Marco Aurélio começou seu voto criticando novamente o fatiamento do julgamento. “Seria pertinente nós vogais termos uma visão conjunta do processo, uma visão conjunta do que foi elaborado pelo relator e revisor”, disse Marco Aurélio.

“Não há crime por presunção”, disse Marco Aurélio ao absolver Vinícius Samarane. O ministro disse que, embora Samarane dirigisse a área de controle interno do banco, ele não operava a parte financeira, já que o setor atuava mais sob o ângulo administrativo. “Antes, se ter um culpado solto do que um inocente preso”, observou Marco Aurélio. O ministro ainda observou que Samarane subscreveu o relatório que encobria as fraudes em conjunto de mais de uma dezena de outros funcionários. “A situação dele não é diferente dos demais que subscreveram o relatório e não foram acusados pelo Ministério Público Federal”, ponderou.

Já o ministro Celso de Mello fez referência à doutrina do domínio funcional do fato para justificar a condenação de Samarane e absolver Ayanna Tenório, votando, assim, de acordo com a linha de pensamento aberta pelo voto da ministra Rosa Weber.

Celso de Mello afirmou que, quando o crime é praticado em concurso de pessoas, não é necessário que todos os réus tenham praticados todos os atos ilícitos. Samarane, afirmou o ministro, “incluía-se no itinerário criminoso” , tomando parte da produção de documentos que tinham por fim omitir as fraudes embora não tenha participado destas.

“Cada co-autor tem a sorte do fato total em suas mãos, através do cumprimento de uma função específica na perpetração de um projeto criminoso”, disse Celso de Mello ao citar o jurista Claus Roxin, autor da obra “Autoria e Domínio do Fato em Direito Penal”.

Despersonalizar as diferenças
Celso de Mello elogiou também em seu voto o esforço do ministro Luiz Fux, durante sua fala na quarta-feira (5/9), de aproximar a questão dos crimes financeiros a aspectos constitucionais. Para o decano, a regulação penal de crimes dessa ordem buscam garantir o cumprimento de um mandamento constitucional, uma vez que tratam da segurança da ordem econômico-financeira.

O ministro também procurou, durante o seu voto, despersonalizar as diferenças de ponto de vista entre os ministros sobre a matéria em julgamento. Celso de Mello observou que, como decisão colegiada, a solução emana do Supremo e não individualmente, e que, dessa forma, o veredito se sobrepõe às figuras dos ministros.

No entanto, a despeito do esforço do decano, o ministro Joaquim Barbosa insistiu em lembrar de sua atuação à frente da condução do processo. “Espero que nunca esqueçamos os ataques covardes de que fui alvo tendo como sempre pano de fundo essa açao penal”, disse o ministro relator.

Rafael Baliardo é repórter da revista Consultor Jurídico em Brasília.

Revista Consultor Jurídico, 6 de setembro de 2012
Quando existe a corrupção “é irrelevante a destinação do dinheiro, tanto faz se foi usado “para satisfazer necessidades pessoais”, “solver dívidas de campanha” ou para “atos de benemerência””. (Celso de Melo)