domingo, 12 de fevereiro de 2017

A buerguesia Fede

Folha de São Paulo, 10 de Fevereiro de 2017


Há dois meses, frequento uma academia de playboy em Higienópolis. Academia já é um troço meio deprimente e, perdão, outra opção mais barata, com aparelhos vagabundos, quebrados e sem bons professores, me pareceu ainda mais cruel.

Claro que prefiro um estúdio de pilates na Vila Madalena (apesar de ter muita preguiça de falso hippie, gente que chega de Jeep falando que só come alimentos germinados, gente que passa o dia postando sobre empoderamento, mas não trabalha ou gente que paga R$ 50 mil em uma ambulância do Einstein pra poder parir em casa porque é contra hospital). Mas o ortopedista me mandou parar com tanto alongamento cabeça e puxar ferro de verdade. Obedeci.

Em nome de minha sanidade mental, comprei um fone de ouvido wireless, enorme, vedação completa. Tenho sérios problemas com o sotaque de algumas jovens abastadas (principalmente quando em turma). Por que, por Deus, elas falam como se ter a pior rinite do século and um curso de debilidade italiana and um nabo enfiado no ânus resultasse em uma dicção aceitável (e sexy?)? Tipo meeeeu. Ai â-miii-gahhh. Por que elas falam cáh-sah em vez de casa? Sou obcecada em odiar esse sotaque.

Durante o banho, infelizmente, não consigo usar o fone de ouvido e acabo escutando um ou outro papo. Pra minha surpresa, nem todas são antas que vivem de selfie e herança, muitas são médicas, advogadas, jornalistas, CEO de empresas. Mas o sotaque é quase unânime. Rico paulistano jovem (ou querendo ser jovem) tem voz de burro, não tem jeito.

Mas esse texto é pra falar de outra coisa. Eu queria pedir a você, pessoa frequentadora de academia de playboy em Higienópolis: não feda. Esse é o mínimo que você pode fazer pela classe trabalhadora. Veja, minhas reuniões começam cedo e vão até bem tarde. Muitos desses encontros me fazem suar frio, pois tenho bastante medo de perder o emprego e não ter como pagar as contas. E ainda assim, quando estou ao seu lado, performando no elíptico ou no aparelho que simula escadas, eu não fedo.

Nunca, nem mesmo na aula de “samba funcional” eu federei. Minha nécessaire tem maravilhoso desodorante do qual faço uso ao menos três vezes ao dia. O nome disso é respeito ao coleguinha.

Mas você, que parou seu carro de qualquer jeito, pegando três vagas, que largou a esteira funcionando porque vive totalmente absorvido pelo esplendor da sua existência, vai lá se preocupar se eu estou verde ao seu lado? Se a minha bile, açoitada com o seu cheiro de esfiha vencida, está encharcando meu esôfago em refluxos agressivos de inconformismo? Não, você está pouco se lixando se a sua axila aniquilou a salubridade olfativa de 20 metros quadrados.

O odor do andar dos aparelhos aeróbicos da academia de playboy de Higienópolis beira a indecência. É flato de quem comeu 34 ovos no café da manhã misturado a bafo de quem está de regime (aquele bafo de bexiga de aniversário) misturado a sovaco assassino. Vocês nem parecem que votaram no Dória, estudaram na Faap e velejam em Ilhabela! Que feio galera! Feder e falar como pato sequelado é demais pra minha cabeça.

Talvez sua autoestima bem nascida lhe murmure: que nobre odor de testosterona em spray! Não, querido, você fede. Talvez aquelas pândegas no Café de La Musique tenham tirado suas narinas da jogada. Talvez não seja egoísmo, apenas anosmia festiva. Mas vá por mim, sem o devido cuidado, você fede. E feder, mesmo pra quem tem a vida ganha, é a mais escandalosa e vexatória derrota.

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